Quando o gato cinza pulou no colo de Sandra Mara, ela alisou o seu dorso delicamente. Em seguida, porém, empurrou-o para o chão e puxou a bacia para o centro da sala. Espiou se a chaleira estava fervendo e começou a encher a bacia, uma bacia grande, quase uma banheira, pensou.
O gato ronronava em sua volta, lambia-lhe os pés, encostava o rabo em suas pernas. Sandra Mara não se incomodava com aqueles afagos inoportunos, mas naquele momento, não eram bem-vindos, por isso o empurrou novamente com o pé. Ele deu um gemido e pulou para uma prateleira na parede oposta à do fogão.
Ela retirou a chaleira do fogo e começou a encher a bacia. Abriu novamente a torneira, desta vez para encher uma jarra e não a chaleira. Depois esfriou um pouco a água da bacia com a da jarra. Colocou delicadamente os dedos provando a quentura e tirou-os de imediato. Ainda estava muito quente. Retomou a tarefa de esfriar a água, observada pelo gato sobre a prateleira. Experimentou mais uma vez, agora enfiando toda a mão. Estava ótima. Desfez-se das roupas completamente e nua entrou na bacia, sentando-se pouco à vontade, pelo tamanho da mesma.
Um dos filhos entrou na cozinha perguntando-lhe alguma coisa. Ela respondeu tranquilamente no processo de ensaboar-se sem se preocupar com quem entrava.
Novamente a porta se abria e surgia uma criança, e mais uma, daqui a pouco a cozinha estava cheia. Sandra Mara respondeu a todos o que pediam, e desta vez, achou que já estava demais aquele público. Mandou-os embora.
O gato espiava a cena, desta vez, pendurado no bandô engordurado da cortina.
Sandra Mara voltou a ensaboar-se com cuidado, jogava água nos seios, na barriga e enfiava a mão no fundo da bacia, higienizando as partes íntimas. A água respingava no piso de ladrilhos gastos, quase inexistentes. Ficou naquele ritual por tanto tempo, que quase pegou no sono. Quando se deu conta, já escurecia e a cozinha estava na penumbra. Levantou-se, ligou o interruptor e passou a enxugar-se calmamente, caminhando pela cozinha, de um lado para o outro. Estava quase pronta para vestir a roupa doada pela campanha.
As crianças entraram outras vezes, dois meninos e uma menina, mas ela não se preocupou com isso. Podia chegar até um adulto, uma vizinha próxima que não a importunaria. Estava acostumada em tomar banho na cozinha, naquela bacia que mais parecia uma banheira, afinal, não tinha chuveiro e não podia se acostumar com estes luxos.
O gato cinza desta vez pulou para o chão e passou a rondar-lhe os pés e quando ela sentou numa cadeira, ainda nua, ele tentou pular em seu colo. Correu-o irritada. Tudo estaria bem, se não fosse aquele gato enxerido.
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