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terça-feira, dezembro 13, 2016

A fotografia da vida de Santa -CAP. 26

Capítulo 27

Linda levantara mais cedo do que de costume. Após chamar um táxi, afastara-se da casa imediatamente, sendo observada por Santa, que se perguntara onde ela iria. O motivo que relatara é que retiraria uns documentos no correio, mas Santa não acreditara na desculpa. Em todo caso, agora nada importava em relação à Linda, a não ser esperar o momento certo para desmascará-la e a afastá-la para sempre de sua casa.

Neste momento, suas preocupações principais referiam-se à situação difícil em que o filho se encontrava. O caso ficava cada vez mais difícil de ser esclarecido, tornanando-o responsável pelo assassinato de Fernando.

Além disso, Alfredo estava ainda mais implicado com a acusação de sequestro revelada na gravação do celular da vítima, no qual o próprio Fernando dizia não querer tomar parte e por isso, se garantia de uma presumível acusação.

Santa observava pela janela Linda afastar-se rapidamente e ficar na porta da casa, quase na esquina à espera do veículo. Em seguida, não a viu mais e voltou para os seus pensamentos que a deixavam mais aflita. Como estaria Alfredo, numa situação deplorável de preso comum, um homem educado, que nunca tivera contato com marginais e que de uma hora para outra, convivia nos mesmos espaços.

Enquanto isso, Linda não demorara muito no seu trajeto, descera rapidamente e se aproximara de uma casa modesta.

Ao chegar na porta, ligou para alguém tentando confirmar o encontro.

A mulher que abriu a porta, parecia um pouco surpresa com a sua presença, embora soubesse que a encontraria lá. Pediu que entrasse e esperasse uma xícara de chá, que prepararia em seguida.

Linda olhou a amiga sem mostrar nenhum interesse. Disse que apenas esperaria a pessoa que chegaria, conforme o combinado.

Lúcia sentou-se ao seu lado e insistiu que tomasse o chá, pois era bom para quem estava nervosa como ela, segundo supunha.

– Você tem razão, Lúcia, mas pretendo acabar com esta história de uma vez por todas. Não tenho vontade nenhuma de tomar chá.

– É uma pena tudo que aconteceu, Linda. Eu sinto muito, de coração. Sei o quanto você está sofrendo e como amava aquele sobrinho.

– Pois é, Lúcia. Eu não podia passar por isso. Tudo poderia ser diferente, se você não tivesse entregado a mensagem com aquela gravação para dona Santa. Depois que ela soube de tudo, as coisas começaram a mudar muito naquela casa, ela fez tudo para me prejudicar.

–Pensei que você se referia ao seu sobrinho. Foi uma morte cruel.

–Sim, também e sabe Deus como morreu, como mataram ele! Tudo resultou naquela morte terrível. Mas eu estou falando noutras coisas.

– Me desculpe, Linda. Você sabe que eu não entendo bem dessas tecnologias, eu estava atrapalhada na igreja, o celular dava um sinal a cada um minuto. Foi então, que dona Santa pediu para ver o que estava acontecendo e tentou ajudar-me.

–Ajudou tanto que pegou pra ela a gravação. Mas deixa pra lá, agora isso também já é passado. Eu preciso descobrir uma coisa e isso é mais importante do que tudo, neste momento!

– Desculpe lhe perguntar Linda, você sabe que não gosto de me intrometer na vida dos outros, mas você é minha amiga e me sinto na obrigação de lhe perguntar. Você se refere ao Bispo Martim?

– Sim, você tem razão, quero ter uma conversa muito séria com ele, mas parece que está receoso em vir. Estou aqui há quase uma hora e nada dele aparecer.

– Ele não é um homem de faltar a seus compromissos, a menos que tivesse algum compromisso urgente, de última hora.

Linda fica em silêncio um pouco, pensativa. Depois, se volta para Lúcia e pede que ao chegar o bispo, ela se afaste e os deixe sozinhos, pois se trata de um assunto confidencial.

– Não se preocupe, Linda, fique à vontade. Você sabe que sou sua amiga.Eu não vou ficar atrás da porta ouvindo a conversa.

Neste momento, elas ouvem o barulho de um carro se aproximando. Lúcia corre à janela e percebe que é o bispo Martim que está chegando. Linda pede que Lúcia se retire para o interior da casa e a deixe sozinha. Depois, decide dar-lhe algum dinheiro para que saia de casa e compre algumas coisas. Pretende ter uma conversa sozinha com o Bispo.

–Mas não é preciso tudo isso, Linda.

–É sim, você estando na casa, ele ficará temeroso em se abrir, não vai querer falar nada. Por favor, Lúcia, voce já me decepcionou uma vez, não o faça de novo. Vá ao shopping, fique um tempo lá, pelo menos uma hora. Olhe aqui tem também dinheiro para o táxi. Você faz isso por mim?

– Está bem, Linda, se você acha melhor desse modo, eu vou. Pode ficar tranquila.

– Agora, abra a porta e aproveite para sair. O homem já tocou duas vezes, daqui a pouco, desiste.

Linda pega um casaco rapidamente e abre a porta, cumprimentando efusivamente o bispo Martim que se surpreende com a sua saída. Ela afasta-se e Linda aparece, pedindo que entre.

O homem a cumprimenta e senta-se no sofá na ponta oposta à que Linda estava sentada. Linda então, levanta e aproxima-se dele sentando-se numa poltrona mais próxima. O bispo fica pouco à vontade e pergunta, intrigado:

– Linda, o que aconteceu? Foi a sua patroa que a mandou até aqui? Não entendi porque não foi até a igreja.

– A igreja não é um lugar adequado para a nossa conversa, bispo.

O bispo retira um lenço do bolso e o passa pela testa secando o suor que a invade, desde às grandes entradas até alguns fios que estão molhados. Olha-a com desconfiança.

– Você não me respondeu, foi Santa que a mandou aqui?

– Não bispo Martim, eu é que queria ter um assunto muito sério com o senhor. Dona Santa não tem nada a ver com isso!

– E por que na casa de sua amiga? Por que não na sua casa, onde mora na mansão com a Santa?

– Eu não moro na mansão, o senhor sabe. Fico numa pequena casa aos fundos. Lembra-se que meu marido era o caseiro, principalmente quando todos viajavam?

– Sim, é claro que sei, foi o que eu quis dizer.

– Pois bem, lá eu não teria liberdade de conversar com o senhor, sem que todos soubessem que estava lá.

– Está bem, Linda, o que é que você quer de mim?

– A verdade, bispo Martim. A verdade.

Ele novamente passa o lenço pela testa, agora trazendo-o até a boca, que parece ressequida. Pede um copo de água e levanta-se apreensivo.

–Sente-se, bispo, sente. Eu já lhe sirvo.

– Obrigado, Linda. Eu só levantei para tomar um pouco de ar, vou abrir a janela um pouco, se não se importa, está meio abafado.

– Está bem, espere aí que já volto.

Linda corre até a cozinha e volta com a água. O bispo torna a sentar-se e enquanto absorve o líquido, a observa com curiosidade. Linda percebe e parece sentir-se mais segura em seus objetivos. Senta-se a sua frente novamente e começa a falar.

– Eu falei sobre a verdade que eu queria saber. Refere-se ao meu sobrinho Fernando.

O bispo Martim estremece o lado esquerdo da boca. Em seguida, faz um gesto sombrio, como se devesse mostrar um sentimento triste. Junta as mãos, tocando-as na boca e abaixando os olhos. Depois, complementa:

– Você deve estar muito triste Linda, eu entendo o seu sofrimento.

– Não tanto quanto devia. Estou triste sim, mas Fernando sempre foi um incômodo para mim. Eu o ajudava, mas ele não correspondia. Estava sempre aprontando das suas. Ele queria vencer na vida a qualquer preço e embora se fingisse de humilde e trabalhasse como jardineiro, ele tinha planos bem pretensiosos.

O bispo insiste no melodrama:

– Ele me parecia muito apegado a você. Sempre demonstrava um carinho por sua pessoa, inclusive eu percebia que a tratava muito bem.

– O senhor não precisa tentar me agradar. Eu sei que ele não gostava de mim, ele me suportava, porque precisava do emprego, para poder ficar em liberdade. E ele não gostava das condições que eu impunha.

O bispo Martim mostra-se surpreso.

– Mas então?

– Então bispo Martim, que não quero falar sobre mim, nem sobre a maneira como ele me tratava. Quero falar na relação que o senhor tinha com ele.

O bispo empalidece. O lábio volta a tremer e parece sentir-se perdido, sem saber o que dizer. Linda percebe o seu estado perturbado e prossegue, enfática:

– Não cabe a mim julgar ninguém, nem me interessa a vida dos outros, mas sei perfeitamente que existia uma relação muito estreita entre vocês dois.

O bispo abre o colarinho, tentando sentir-se melhor. Cada vez mais pálido e com a voz trêmula, se atreve a retrucar:

– Não diga bobagens, Linda. Você está falando coisas que desconhece.

– O senhor tem razão, bispo, sei muito pouco sim, por isso quero que me diga a verdade. Estou esperando.

Desta vez, ele parece recobrar a confiança, embora se levante com dificuldade. Depois disso, afasta-se em direção à porta. Volta-se e encara Linda com desprezo.

– Sabe de uma coisa, Linda? eu não tenho nada a fazer aqui. Não sei a que você se refere e não estou interessado. Por favor, se me dá licença…

Linda porém o intercepta antes que chegue à porta, retirando uma arma da bolsa e apontando-a em sua direção. Ele se assusta, arregalando os olhos, surpreso. Pergunta, ainda tentando tomar o controle da situação.

– O que está acontecendo Linda, você está louca? Você me respeite e sente-se onde estava. Você, uma mulher temente a Deus, fazendo um papel destes! Largue esta arma, Linda!

– Acha que estou louca bispo? Pois então, o senhor que deve ser um homem temente a Deus, deve obedecer-me e contar tudo o que sabe ou lhe meto uma bala na cabeça. É isso que quer?

Ele da alguns passos incertos aproximando-se do sofá onde estava. Pede que ela se acalme e reflita bem no que está fazendo. Aos poucos, senta-se, sempre com os olhos fixos em Linda. Sua expressão revela intenso pavor. Linda ao contrário, está segura i e determinada a conseguir a confissão que deseja.

– Vamos, que está esperando? Eu não tenho todo o tempo do mundo.

– Mas o que você quer saber, Linda? Pelo amor de Deus!

– Não fale em Deus, seu canalha! Eu nunca vi alguém testemunhar ao contrário a doutrina da igreja com tanta eficiência como você! Eu quero saber se Fernando pagava você para terem relações sexuais, se fazia chantagem com você, quero saber tudo!

– Mas para que, Linda? O que você vai conseguir com isso? O que vai conseguir com estes insultos a minha pessoa? Eu sou um religioso, Linda, veja bem a que você está me expondo.

– Por enquanto, eu não lhe expus a nada. estamos só nós dois nesta casa e a única coisa que quero é a verdade. Agora, desembucha que estou perdendo a paciência!

O bispo quase se descontrola, soluçando por alguns minutos, mas logo se recompõe, assoando o nariz e limpando diversas vezes o suor da testa, que se torna mais intenso. Com os olhos vermelhos, tenta se defender:

– Você sabe, como todo ser humano, eu tenho falhas. Sou fraco, muito fraco, e olhe que lutei toda a minha vida, mas há um momento, em que cedemos, em que não temos forças suficientes para vencermos a tentação.

–Não enrola, bispo. Vá em frente, sem muita lamúria.

–Bem Linda, eu sempre tive atração por rapazes.

– Parece que você tem atração por tudo, pegou até a velha mãe de Sandoval! Talvez tenha tesão até por árvores!

– Por favor, não me humilhe, Linda. Eu estou desconhecendo você, tão ponderada, tão afeita à moral, à educação, à religião. Por que me trata assim? Eu estou desesperado, falar isso para você é muito difícil para mim.

– Eu também o desconheci muitas vezes, mas isso não vem ao caso. Quero ouvir de você tudo! é só o que me interessa!

– Pois bem, quando eu visitava a dona Santa, eu costumava conversar com o rapaz. Ele sempre fora muito gentil, até parecia ter uma empatia comigo.

Linda sorri irônica, mas fica em silêncio, esperando o desfecho.

– Certa noite, ele me pediu carona, parece que pretendia fazer algumas compras, se não me engano, precisava de algumas roupas. – ele faz uma pausa e olha para Linda submisso – Linda, você não se importaria de apontar a arma para outro lado, sei lá, de repente, você se engana e atira. Eu fico nervoso com esta situação.

– Está bem, mas não faça nenhuma besteira, não tente se levantar deste sofá, que eu atiro. Agora, prossiga.

– Bem, como eu estava dizendo, as caronas se sucederam. Sempre que o via, até mesmo na rua, ele me pedia que o levasse em algum lugar. E sabe, ele me olhava de uma maneira que não deixava dúvidas. Ele me seduzia com o olhar, Linda, então, eu não tive alternativa, eu acabei caindo na dele, entende?

– E depois, o que aconteceu?

– ele começou a pedir-me presentes, roupas, sapatos, até dinheiro.

– E onde se encontravam?

– Linda, é claro que nos motéis. Eu pagava a ele, Fernando era um garoto de programa, pelo menos para mim, embora eu sentisse muito mais do que uma simples atração sexual. Eu tinha um carinho especial por ele.

– Um garoto muito caro, não?

– Sim. Ele era esperto, começou a exigir bem mais do que eu podia dar, eu precisava arranjar dinheiro todas as vezes que nos encontrávamos, além das coisas que comprava.

– Muito mais do que bens materiais, ele era caro em relação ao que ele sabia. Você poderia perder o seu cargo, ser execrado da comunidade, talvez até expulso da igreja ou no mínimo, mandado embora.

– Sim, é verdade.

– E o que aconteceu depois?

– Depois não aconteceu nada. O pobre rapaz foi assassinado. Eu não sei de nada, não sei o que aconteceu.

–Mas ele lhe fazia chantagens.

– Não, ele apenas brincava, que um dia contaria tudo, que falaria na igreja, no bispabo, mas nunca dei importância. Sabia que era apenas uma maneira de me prender a sua sedução, sabe? Na verdade, ele nunca fez chantagens.

– E esta carta aqui que eu tenho a cópia, que ele mandaria para o bispado, contando tudo, toda a sacanagem que vocês faziam? Isso não é chantagem?

O bispo fica desolado. Abaixa a cabeça, quase levando-a ao colo, segurando-a com as mãos. Ainda, sem olhar para Linda, pergunta:

– E como você tem esta cópia?

– Porque eu sabia tudo que acontecia com ele. Não se esqueça que ele morava comigo, me devia favores. Fernando era um cara que devia à justiça e eu o ajudava, tanto que ele nunca teve problemas, mesmo estando no regime de condicional.

– Mas eu jamais tive contato com esta carta. Soube qualquer coisa, mas não dei importância, ele nunca me faria mal.

– Não se faça de idiota, bispo Martim. Você sabia e muito mais, porque ele lhe fazia chantagens, a ponto de lhe pedir muito dinheiro. E outra coisa de muito valor que não era sua: a bússola de ouro. Ele queria a bússola que estava na igreja, que pertecera à família de dona Santa.

– Por favor, Linda, pare com isso, por favor, você está me deixando doente, estou passando mal. Olhe, como estou suando.

– Não é pra menos, mas se quer acabar com isso, fale tudo. Diga o que aconteceu com Fernando.

– Eu já lhe disse tudo, eu caí na tentação, fui um louco, um idiota, eu nunca deveria ter feito aquilo! Estou muito arrependido, se eu soubesse meu Deus, o que ele faria, jamais teria me aproximado daquele rapaz!

– Fora toda a sacanagem que fizeram juntos, isso não me interessa. Quero saber sobre as ameaças. Quero saber se você se vingou de Fernando, pela sua boca, agora, neste momento ou lhe mando para o inferno! – nete momento, ela volta a apontar a arma para o bispo – Estou aqui pra tudo bispo, quero a verdade ou lhe dou um disparo bem no peito! É isso que você quer?

– Voce pretende me matar de qualquer jeito, eu já entendi tudo.

– O senhor é inteligente, bispo. Mas se não há alternativa, então fale tudo. Fernando o ameaçava, o que mais ele fazia para apavorá-lo?

– Está bem, está bem, eu falo então. Ele escrevera a carta, mas havia um video, um video íntimo nosso, que ele dizia que publicaria na internet.

– Que nojo! Você me dá asco, bispo!

– Você não pode me julgar, Linda. Ninguém pode me julgar, só Deus! Além disso, você não é a santinha que parece, você tem um filho com o Sr. Sandoval. Pensa que é melhor do que eu?

– Mas eu não matei ninguém!

– O que você quer dizer?

– Que você veio aqui, na noite do crime, que você o matou antes de Alfredo chegar! Você é o assassino! Foi você seu miserável! Confesse, desgraçado, confesse que matou o meu sobrinho!

– Já que você quer saber, Linda, eu matei sim! Matei aquele desgraçado que queria a minha ruína, que queria acabar com a minha vida! Eu o matei porque era ele ou eu, pois saiba, eu tinha a chave da casa, eu transava com o seu sobrinho na casa que era de sua irmã, e foi ali, que marquei mais uma vez um encontro, só que para matá-lo! Agora me mate, acabe comigo e me mande para o inferno, como você disse! Vamos, acabe com isso!

– Não, você está enganado, eu não vou matá-lo, você vai para um lugar muito pior, pois a polícia vai prendê-lo agora, porque eu combinei com eles que estão na escuta e com um toque no celular já estão aqui para pegá-lo.

Neste momento, a porta se abre e três policiais surgem, enfrentando o bispo Martim, acusando-o de homicídio premeditado e algemando-o.

sábado, dezembro 10, 2016

A fotografia da vida de Santa - CAP. 26

Sábado, 10/12/16 - Em breve o final deste folhetim dramático.

Capítulo 26

Após o enterro de Fernando, Linda voltou para a casa e trancou-se em seu quarto. Apesar de todas as desconfianças e presumíveis ameaças da empregada, Santa estava penalizada com o seu estado de sofrimento. Tentou ser solidária embora Linda se mantivesse reticente. Santa também estava desolada pelo fato de Alfredo estar preso. Tudo parecia voltar-se contra a sua família e não havia nada que pudesse fazer. Então teve a ideia de fazer uma nova reunião, já que não havia conseguido unir a família pela missão que acreditava ter que cumprir, a uniria pela salvação do filho.

Aos poucos, todos foram chegando. Sandoval aguardava ansioso e transtornado pelos últimos acontecimentos. Letícia e Ricardo foram os primeiros a chegar. Tavinho desceu do carro, em seguida, incomodado por mais uma convocação da mãe, que achava que poderia resolver tudo ao seu modo. Entrou na casa e foi na direção da biblioteca, mal humorado. Santa aproximou-se do filho e o beijou, pedindo em seguida que sentasse numa das cadeiras em torno da mesa. Em seguida, iniciou a conversa.

– Mais uma vez estamos juntos, só que nunca imaginei que seria desta forma, principalmente por Alfredo estar longe de nós – a voz estremeceu, emocionada ao falar no filho. – Entretanto, precisamos unir forças para tirá-lo daquela prisão.

Ricardo abre uma agenda e rabisca alguma coisa. Fala com certa irritação sobre a ida de Letícia à casa de Fernando, ao lado de Tavinho.

– Se eu soubesse que Letícia tinha feito a bobagem de ir até aquela casa, eu não teria deixado. Aliás, não entendi até agora o motivo.

– Por favor, Ricardo, já conversamos sobre isso. Não recomece.

Santa os interrompe, impedindo que a briga deturpe o objetivo do encontro.

– Agora não é momento para recriminações, Ricardo. Eles foram até lá e assunto encerrado.

– Desculpe, Santa, mas não é assunto encerrado. Eu gostaria que meus filhos explicassem porque foram conversar com o jardineiro naquele dia. Quero saber o motivo, afinal vocês colocaram toda a família em risco.

Letícia fita o pai com certa indignação e responde com veemência:

– Então está bem, papai, já que o senhor quer realmente saber. Nós fomos falar com o Fernando sim, porque ele devia saber muito mais coisas do que sabíamos, principalmente sobre o senhor e Linda.

Sandoval empalidece, mas não se deixa abalar. Defende-se como pode.

– Na verdade, Letícia, sua mae sabe tudo o que aconteceu. Eu fiz questão de esclarecer tudo a ela, contei inclusive que estava sendo chantageado por Linda por causa da gravação de nossa reunião, naquele dia.

Tavinho suspira, manifestando certa culpa pelo que fora proposto na reunião e que certamente Santa devia ter conhecimento de tudo. Aproxima-se da mãe e acaricia-lhe o ombro, desajeitado.

– Mamãe, você deve ter ouvido toda aquela papagaiada, eu só concordei porque quero viver a minha vida, eu fiquei alheio a tudo aquilo.

– Eu sei Tavinho, todos vocês tiveram papel crucial naquela decisão. Todos tinham os seus interesses particulares, ninguém pensou em mim, que seria considerada uma velha louca.

–Não é bem assim, mamãe!

– É sim, Letícia, você sabe que é. Você declarou que eu estaria tirando a liberdade de vocês, talvez tenha razão. Você achou que eu havia me arriscado demais, me metendo onde não devia. E você Tavinho, você lavou as mãos, como Pilatos. O único que sofreu mais e relutou com a decisão foi o Alfredo. Ele concordou também, mas não queria que eu descobrisse que fosse tachada de louca. O Ricardo inclusive, colocou em dúvida a aparição da Virgem, julgando-me sem qualquer escrúpulo.

Ricardo a interrompe, desculpando-se: – Ah, dona Santa, a senhora há de convir que era tudo muito estranho e se o próprio Seu Sandoval, seu marido afirmava isso, seria eu que duvidaria?

Ela o olha entediada. Volta-se para Sandoval e dispara, com raiva:

– E você Sandoval, foi o traidor, infelizmente.

– Por favor, Santa, não vamos recomeçar! Agora não entendo como você sabe de tantos detalhes. Quem lhe contou? Foi você, Letícia?

– A senhora não disse a ele, mamãe?

– A que você se refere Letícia - e voltando-se para Santa – há mais alguma coisa que desconheço, Santa?

– Mamãe recebeu a gravação quando Linda enviou a mensagem para uma amiga. Ela sabia de tudo desde o primeiro momento, por isso não caiu na armadilha que vocês arquitetaram!

– Você sabia, Santa? Então eu não tinha motivo nenhum em obedecer àquela mulher.

– Naquele dia, eu havia ido à igreja, e uma amiga de Linda recebera a mensagem com a gravação. Ela seria o suporte dela, mas eu acabei sabendo de tudo, passei para o meu celular na hora. No entanto, fiquei quieta, pois precisava saber até que ponto você iria, até que ponto tentariam me anular, me transformar numa mulher imprestável.

– É papai, o senhor pisou na bola e mamãe foi muito esperta.

– Mas eu não entendo. Linda deveria ter descoberto que a a tal mulher, se era amiga dela, mandou para você a mensagem.

– Não sei, isso é um mistério. Ela deve ter se comunicado com Lúcia, a mulher que recebeu a mensagem com a gravação. Deve ter contado tudo, mas você sabe que Linda é dissimulada. Certamente, ele mudou de planos. Talvez nem você Sandoval fizesse mais parte dos seus planos.

– Isso é um absurdo, meu Deus! - exclama Sandoval, aniquilado. Santa levanta-se da cadeira e encaminha-se para uma posição em que consegue observar a reação de cada um. Assim, em pé, continua:

– Mas eu não os chamei aqui para ficarmos remoendo esta história. Há muito tempo eu já sabia de tudo, já tinha me frustrado com todas as conclusões que tiveram e agora acabou. Só me interessa encontrar uma maneira de ajudar Alfredo.

– Mas por que vocês acham que o rapaz sabia mais alguma coisa sobre essas manobras de Linda? - pergunta Sandoval, dirigindo-se aos filhos. Santa porém responde com frieza.

– Você mesmo disse Sandoval que ele era o homem que nos assustara naquela noite, andando pelo jardim, aparecendo e desaparecendo e jogando um bilhete pela janela. Você afirmou que tudo fora tudo articulado por Linda.

– É verdade, é verdade. Tenho certeza disso, ela me confiou o seu plano. Mas então… Alfredo também tinha a intenção de descobrir alguma coisa com ele?

Ricardo olha para a mulher intrigado, pretendo impulsionar alguma explicação.

– Vocês dois combinaram ir na casa de Fernando, foi o que você me disse. Eu sabia os motivos, mas por que Alfredo estava lá. Ele deve ter dito alguma coisa para vocês, Letícia.

– Calma, Ricardo. Parece que você está mais interessado do que o papai. Alfredo estava lá, sim, quando chegamos, mas provavelmente tinha a intenção de encontrar alguma coisa que revelasse uma provável armação de Linda. Ele andava desconfiado há algum tempo.

Ricardo intervém, insinuando:

– Eu já tenho as minhas dúvidas, vocês sabem como ele tem interesses estranhos. Vai ver que não era nada do que vocês estão pensando!

– Você é terrível, hem Ricardo, quer calar a boca?

– E o que você acha que tenho que pensar? Você mesma já pensou nisso, que eu sei. Além disso, devemos avaliar todas as hipóteses, querida.

Santa interfere, amargurada:

– Esse não é o caso, gente, pelo amor de Deus. Alfredo é um homem de bem. E por favor, vamos tentar ajudá-lo, não crucificá-lo.

– Estamos aqui para isso. – Complementa, Tavinho.

– Então, contem o que aconteceu naquela casa. - Insiste Sandoval.

Neste momento, batem à porta e Santa afasta-se, tentando saber o que estava acontecendo. Linda surge com o olhar aflito, com olheiras ainda sublinhando a dor que manifesta. Avisa à patroa que o o doutor Tavares, advogado de Alfredo está na sala anterior e tem interesse em conversar com eles. Todos observam a cena surpresos. O que estaria fazendo ali o advogado de Alfredo, o que teria acontecido? Linda afasta-se ao ouvir a ordem de Santa, para que o advogado se dirigisse à biblioteca.

Quando entra, o homem revela-se muito preocupado. Todos fazem silêncio e Santa pede que ele sente à cabeceira da mesa, cedendo o seu lugar. Em seguida, acomoda-se ao lado de Tavinho. O homem começa a falar, desculpando-se.

– Eu não esperava que estivessem tendo uma reunião, por isso peço desculpas. Tenham certeza de que serei breve. Por um lado, foi bom encontrá-los juntos, porque assim, poderei conversar com todos. Como já devem estar imaginando, o assunto só podia referir-se a Alfredo.

– O que aconteceu com meu filho doutor?

– Ele está bem, dona Santa, claro que dentro das condições em que se encontra. Não é nada agradável estar preso, mas pode ter certeza de que está sendo bem tratado, inclusive, por enquanto está numa cela sozinho.

Santa não consegue esconder algumas lágrimas. Tavinho acaricia-lhe as mãos, por um momento. Enquanto isso, o advogado prossegue, enfático.

– Pois é pessoal, eu vim aqui porque preciso da ajuda de vocês para tirar o seu irmão da cadeia. Sei que poderão me informar fatos mais detalhados, que tenho certeza, poderão ajudá-lo com muita eficácia. Infelizmente, posso lhes afirmar que Alfredo está bem encrencado.

– Como assim, o que o senhor quer dizer com isso? - pergunta Sandoval, ansioso.

– Se possível, senhor Sandoval, peço a todos que me ouçam com atenção. Somente assim poderão me ajudar, de algum modo.

– Está bem doutor, por favor, fique à vontade.

– Bem, há uma prova física de que Alfredo esteve lá, embora esteja nos autos que ele confessara ter estado na casa do morto.

– Mas então, essa prova não significa nada. - intervém Ricardo.

– Na verdade, senhores, esta prova corrobora com o que ele disse à polícia. Ou seja, de que esteve lá. O problema é que houve uma limpeza no ambiente, no cenário do crime, entendem? Esta limpeza o incrimina ainda mais, porque ele deve ter feito isso para escapar da condição de suspeito.

– A prova física foi a lente que ele perdeu, doutor? - pergunta Letícia, interessada.

– Sim, foi encontrada, examinada e comprovada que era dele.

– Como meu irmão foi burro! Ele disse que tinha perdido uma lente!

– Meu Deus, Letícia, pobre do seu irmão! Ele é inocente, doutor! Ele não seria capaz de um ato tão torpe!

– É, entretanto alguém tentou se livrar da acusação, seja ele sozinho ou incentivado por outros.

– Estes outros somos nós, não é doutor? É a gente que o senhor se refere?

– Sim, Tavinho, vocês estiveram lá e encontraram o seu irmão apavorado, tentando descobrir se a vítima ainda estava viva. Mas, temos outro problema pior, embora pareça impossível. Uma gravação foi encontrada no celular da vítima. Uma mensagem do próprio Fernando referindo-se a Alfredo.

– Sim, eles devem ter combinado se encontrarem, isso é óbvio.

– Não se trata disso, apenas Letícia.

– Havia mais alguma coisa, doutor? - pergunta Ricardo.

– Sim, eu disse que era uma mensagem do Fernando, uma espécie de monólogo, não uma troca de mensagens apenas.

Santa está cada vez mais nervosa. Questiona o advogado, com a voz trêmula, prevendo que o pior está por acontecer.

– Mas o que o meu filho tem a ver com isso?

– A mensagem é muito grave, dona Santa e está nas mãos da justiça.

– Do que se trata doutor Tavares?

– Senhor Sandoval, eu não gostaria que o senhor soubesse assim dessa maneira do teor da gravação, mas é necessário. Infelizmente, o senhor é o pivô da mensagem deixada pela vítima.

– Mas o que eu tenho a ver com isso?

– O que supomos e o que até mesmo a polícia acredita é que o Fernando, a vítima, tenha feito a gravação para se defender, para garantir que estava isento de um presumível crime que estava prestes a acontecer.

– O senhor pode explicar melhor, doutor? Não estou entendendo nada.

– Bem, Sr. Sandoval, a vítima diz textualmente que Alfredo planejava sequestrar o senhor.

– O que? Isso é um absurdo! Meu filho não faria isso! - grita Santa, em desespero.

– Isto é mentira doutor, meu irmão não teria sangue frio para isso.

– Calma Leticia, deixa o doutor continuar - argumenta Ricardo interessado.

– Alfredo não ia se meter numa merda dessas, a menos que estivesse louco. – conclui Tavinho.

– Bem, pessoal, continuando: A vítima deixa claro que Alfredo queria que ele sequestrasse o pai e o levasse para a casa onde estava morando por um tempo determinado, o tempo suficiente para que ele, Alfredo, pudesse comprovar que a mãe era lúcida e capaz de tomar suas decisões quanto ao patrimônio, longe da presença do pai que para todos estaria viajando. Para isso ele daria uma grande recompensa em dinheiro ao rapaz. Mas, segundo as palavras da vítima, ele jamais faria isso, porque seria preso e não teria chances de sair da cadeia. Entretanto, queria deixar claro quem era o culpado de tudo.

Sandoval levanta-se transtornado e golpeia a porta da biblioteca com raiva. Grita indignado:

–Maldito! Meu próprio filho queria a minha ruína! Ele sempre me odiou, aquele bicha miserável! Com certeza, queria matar-me, acabar comigo!

–Não diga isso Sandoval, pare de insultar o nosso filho, com certeza isso é tudo uma armação. Alfredo é um homem doce, de coração bom. Isso não é verdade, não pode nem ser verdade! - Santa conclui descontrolando-se e caindo num choro convulsivo.

Letícia aproxima-se dela e a abraça, pedindo que se acalme para ouvir o que o advogado tem a dizer. Tavinho também conforta a mãe, ao seu lado. O advogado prossegue, expressivo:

– Verdade ou não, o fato é que esta gravação piorou em muito a situação de Alfredo. Para a polícia, ele é o único culpado do assassinato do rapaz e só falta saber a causa motivadora de tal crime.

– Meu filho não seria capaz de um ato tão torpe! -– Insiste Santa, enquanto Letícia exclama, confusa – Eu estou pasma! Alfredo estava louco, possesso!

– Ou ele queria acabar com o seu pai mesmo, Letícia. O dinheiro, o poder, o patrimônio, tudo conta numa hora dessas. – Afirma Ricardo, categórico. Tavinho insiste:

– Deve existir outra coisa nesta historia toda. Não pode ser isso. Eu também não acredito nessa lorota, meu irmão não ia planejar isso. É loucura. O advogado olha em torno e observa que todos estão muito confusos. Então, responde a Tavinho, tentando esclarecer a situação:

– Loucura ou não, Tavinho, nós não sabemos. Eu conversei com ele, ele foi reticente. Mas o problema é o que lhes falei. Ele está muito encrencado!

– Que apodreça na prisão, esse miserável! - grita do outro lado da sala, Sandoval completamente alterado. Santa o repreende, assustada:

– Não diga isso Sandoval, tenha piedade de nosso filho! Ele é inocente!

– Pois saiba Santa, que já nem tenho certeza de que ele é inocente ou matou mesmo o jardineiro! Um homem que planeja sequestrar o próprio pai, é capaz de tudo!

– Você não pode acreditar nisso, é um erro muito grande. Este rapaz estava louco, certamente queria fazer chantagem com Alfredo, não há dúvidas.

O advogado tenta apaziguar a situação.

– Por isso estou aqui, para ajudá-lo. A polícia já sabe que vocês estiveram lá, então é o momento de dizerem o que viram naquele cenário, o que Alfredo estava fazendo. Você Letícia e você Tavinho precisam detalhar o que viram, dar argumentos para a presença de vocês, pois convenhamos, esta história está muito confusa. Vocês precisam ajudá-lo.

– Eu não tenho mais nada a dizer. Cheguei lá e vi o Alfredo segurando o corpo. Nunca imaginei aquela cena horrenda! - exclama Letícia, enquanto Tavinho complementa que vira o irmão em absoluto desespero, por isso pensaram em ajudá-lo naquele momento.

– E como o ajudaram? De quem foi a ideia de fazer uma limpeza na cena do crime?

– Foi minha, claro. Todos nós estariamos implicados, afinal mexemos em tudo naquela casa. Passamos pra lá e pra cá, porque estávamos muito nervosos, inclusive porque o verdadeiro assassino poderia estar ali, bem perto.

– A gente estava ferrado, por isso, fizemos o que Letícia sugeriu.

– Mas vocês sabem que mexer na cena do crime, desfigurar as provas é um considerado uma falta grave, o fato de extinguir os registros que comprovam um assassinato é uma prova de que queriam se livrar de alguma transgressão. Vocês podem ser acusados de serem cúmplices do assassino. Você deve saber isso muito bem, Letícia. É uma promotora. Eu não entendi porque fizeram isso, uma coisa tão primária.

– O senhor tem razão doutor, é que estávamos muito nervosos, como lhe disse, a família toda ali envolvida, Alfredo apavorado. Não sabíamos o que fazer.

– Foi mal mesmo. – Completa Tavinho.

Em seguida, Sandoval abre a porta da biblioteca e se volta para o grupo, desolado.

– Eu vou me retirar, isso já está me dando náusea. Meu próprio filho armando contra mim e os demais limpando a cena do crime. É uma frustração muito grande.

– Não se esqueça que no fundo, o senhor é o culpado de tudo isso que está acontecendo papai. – Reitera Letícia, sem piedade.

Sandoval afasta-se sem olhar para atrás. Santa está desconsolada, ora dirige-se ao advogado, ora aos filhos tentando achar uma solução. O doutor Tavares ratifica o seu pedido: acha que devem comparecer à delegacia e explicar como tudo se sucedeu, provando que o rapaz já estava morto quando Alfredo chegara. Entretanto, Tavinho faz uma pergunta, que faz todos se olharem surpresos.

– Tudo bem, a gente fez tudo isso, a gente ajudou o Alfredo, mas, vejam, não to afirmando nada, e se meu irmão for o verdadeiro culpado? E se ele matou o tal Fernando?

– Você não acredita nele? - indaga o advogado, intrigado, enquanto Santa acena a cabeça desiludida.

– Eu acredito, mas sei lá, agora veio esta confissão do jardineiro dizendo que ele queria sequestrar o pai.

– Isto é um absurdo, Tavinho. É tudo mentira desse homem!

– Não sei, mamãe, me desculpe, não quero que a senhora sofra mais do que já está sofrendo, mas e se for verdade? Eu já não sei em quem confiar!

– Então deixe que a polícia descubra, que a justiça encontre o verdadeiro assassino. Não será você quem julgará o seu irmão, não acha? Quero apenas que cumpra a sua parte. Você e Letícia devem abrir o jogo, contar o que sabem daquele momento. É só isso o que o advogado está pedindo.

sábado, novembro 12, 2016

A fotografia da vida de Santa - CAP. 19

Capítulo 19

No carro, faz-se um silêncio pesado. Parece que nenhum dos dois sabe o que dizer. Fernando porém ensaia alguns temas como o próprio trabalho, o tempo em que ficou desempregado e a proposta da tia para trabalhar na casa de Santa. Alfredo parece entediado. Não lhe interessa aquele assunto, muito menos falar sobre a vida profissional de Fernando.

Fernando conclui, satisfeito:

— Parece que somos amigos há muito tempo. Engraçado, quando há empatia, o assunto flui, não é mesmo?

Na verdade, não era o que estava acontecendo entre os dois, mas Alfredo concorda. Por fim, pergunta:

— Não acha que devemos parar num bar? Como lhe disse, seria bom conversarmos com mais calma.

Fernando sorri, confiante. Em pouco tempo, estão num bar, tomando uma cerveja.

— Então, me diga, o que é que você queria me dizer?

— Não sei, Fernando. É que sou um homem muito solitário.

— Mas nós não somos amigos. Sou apenas o jardineiro de sua mãe.

— Há pouco tempo, você disse que havia empatia entre nós.

— É verdade, mas… deixa pra lá. Não precisamos de um motivo para tomar uma cerveja, não é mesmo?

— Tem um motivo.

— Como assim?

— Você sabe que venho observando-o há algum tempo, deve ter percebido, não?

— Olha aqui, Alfredo, só quero lhe dizer uma coisa: eu não sou gay.

— Meu Deus, o preconceito é uma coisa terrível.

— Não, eu não tenho preconceito, se tivesse, não estaria neste bar, desculpe a franqueza, conversando com você.

— Você acha que dou pinta?

— Não, você parece mais macho do que muito cara que conheço, mas todo mundo sabe…

— Não se trata disso, Fernando. Não tem nada a ver com orientação sexual. Na verdade, eu nunca pensei em ter um caso com você, se é isto que o está afligindo.

— Ah, sim.

— Como disse, eu venho observando você, além disso, você sabe, sou advogado. Sei que não é uma coisa muito honesta, mas no meu meio, sabe-se de tudo.

— Que eu fui presidiário?

— É verdade. Eu sei tudo sobre a sua vida, sei também que você matou um homem.

— E o que isso tem a ver com o nosso papo?

— Quero que você me ajude. Acho que você é a única pessoa com quem posso contar.

— E o que você quer de mim?

Alfredo entorna o copo, sentindo a bebida gelada escorrer-lhe pela garganta. O suor empapa-lhe o colarinho da camisa. Por um momento, tem a sensação de que está conversando com a pessoa errada, na hora errada, mas agora não há como recuar. Solta o copo e abre um pouco a camisa, enquanto olha fixamente para Fernando.

— Sei que as coisas estão difíceis para você. Olhe, eu não tenho nenhuma intenção de prejudicá-lo, só falei isso porque você precisava saber com quem está lidando. Não podia simplesmente fingir que somente o conhecia como o jardineiro de minha mãe.

— Muito bem, até aí, eu concordo. Mas não entendi qual é a sua intenção.

— Bem, na verdade, eu preciso de um favor.

— Um favor? De repente, todo mundo precisa de um favor meu.

— Por que você diz isso?

— Nada. Esquece.

Alfredo faz uma pausa, pensativo. Em seguida, pergunta se Fernando não quer outra bebida.

— Você não acha que está bebendo muito para quem está dirigindo?

— É verdade, mas você não quer repetir a dose?

— Não. Gosto de beber com amigos, desculpe. Acho que esta já é de bom tamanho.

— Acho que você tem razão. É a segunda vez que afirma que não somos amigos.

Fernando fica calado, olhando para o copo. Alfredo prossegue, um tanto ansioso.

— Claro, claro, não faz diferença.

— Meu amigo, não enrola. Me diz como posso ajudá-lo.

— Preciso explicar-lhe com calma. O assunto é delicado.

Fernando decide pedir outra cerveja, considerando que o assunto será longo. Faz o pedido e o garçom se aproxima, trazendo a bebida em seguida. Alfredo então, põe as cartas na mesa.

— Bem, Fernando, a minha família está passando por um momento muito complicado. Vou resumir a parte que interessa e depois, vejamos como você pode me ajudar.

— Você se refere a sua mãe?

— Um pouco sobre ela sim, mas o problema maior é o meu pai.

— Seu Sandoval?

— Ele está com uns planos malucos, está sendo desonesto com minha mãe e eu preciso ajudá-la de qualquer maneira. Não vou deixar que a considerem louca.

Fernando lembra-se da conversa que tivera com Santa e do segredo que ela lhe confiara. Teria a ver com o que Alfredo falava neste momento?

— E o que você quer que eu faça?

— Quero que dê um susto no meu pai. Não quero matá-lo, não faria isso, mas quero que ele desapareça por uns tempos.

— Cara, eu não sou bandido. O que está havendo hem, todo mundo ta querendo me ferrar, é isso? Eu estou em liberdade condicional, querem que eu volte pra cadeia?

— Escute, Fernando, você vive naquela casa, praticamente todo o dia. Sei que desde que foi para lá, tem ficado na casa dos fundos, junto com Linda. Você deve estar a par de tudo.

— Eu vou sair de lá. Você sabe para onde estou indo agora.

— Tudo bem, você vai voltar para a casa que era de seus pais, mas continuará trabalhando em minha casa.

— Como assim, um susto?

— Eu pensei muito quando você pretendeu se mudar. É uma casa abandonada, num lugar afastado. Eu quero que você o leve para lá, por uns tempos, até que eu resolva todos os problemas de minha mãe.

— Você quer que eu sequestre o velho?

— Sim, mas será por um mês.

— Você não parece advogado, né, a menos que queira me ferrar mesmo! Então não sabe que toda a polícia vai procurar o velho na minha casa? Será o primeiro local que procurarão.

— Não, ninguém o procurar, não se preocupe, porque direi que ele decidiu viajar. Invento qualquer coisa em relação à empresa. Não se preocupe, não acontecerá nada com você.

— Que família desgraçada, hem!

— Por que diz isso?

— Porque a sua mãe também está planejando contra o velho.

— Como assim?

— Contra ele e minha tia. Parece que os dois estão de conluio, estão querendo enlouquecer ela, foi o que me contou. Então, ela quer que eu descubra tudo e consiga provas para mostrar a vocês, a toda a família o que eles estão aprontando.

— Meu Deus, eu tinha razão. Meu pai quer ficar com toda a fortuna, sozinho.

— Mas tem mais coisa aí, você sabia que seu pai tem um filho com Linda? Foi o segredo que sua mãe me revelou.

— Miserável! Eu não sabia de nada!

— Os dois tem um plano, mas não sei ainda se estão juntos por conveniência ou por que minha tia o chantageou.

— Então, o meu plano tem muito mais razão de existir. Este canalha não pode ficar impune!

— Mas o que você pretende fazer com o sumiço do velho?

— Nesse meio tempo eu pretendia provar que minha mãe é uma pessoa lúcida e capaz. Não posso deixar que ele participe do processo, porque vai moldar a situação de acordo com seus objetivos. Mas, agora sabendo o que sei, que você me disse, o caso muda de figura.

— Por que?

— Porque é muito mais grave do que eu pensava. Nós sumimos com ele e você aperta com sua tia. Nós vamos provar que os dois estavam planejando se livrarem de minha mãe.

— Eu não posso fazer nada contra minha tia, porque ela me ameaça, me joga na cadeia novamente.

— Mas você pode fingir que não sabe de nada e começa a se preocupar com ela, perguntar coisas. Não pode enfrentá-la, apenas. Tem que ser cínico.

— E o que eu ganho com isso?

— Eu posso lhe dar um bom dinheiro, é isso que interessa, não é mesmo?

— E o que eu faço com a proposta de sua mãe?

— Faça a sua parte, descubra tudo com a sua tia, não é o que ela quer?

— Sim, inclusive sobre os remédios. Sua mãe desconfia que minha tia está lhe dando calmantes fortíssimos, para que se esqueça das coisas.

— Muito bem, faça isso. E faça o que lhe pedi, tenha certeza que só tem a ganhar.

— E como vou fazer isso? Eu já lhe disse, eu errei uma vez, fiz uma burrada, acabei matando um homem, mas não sou um bandido. Eu não quero voltar pra prisão!

— Só tem uma maneira: fazer a coisa certa. Pode deixar, eu vou ajudá-lo.

Fernando coça a cabeça, intrigado.

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A boca vermelha, cabelos loiros, olhar perdido. Nem sabe se fazia pose, encenava ou apenas acessório do cenário. Assim os observava de re...

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