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Mostrando postagens de junho 24, 2015

Vida empalhada

Não sei se era noite de lua ou escuridão total, nem se as luzes artificiais da rua iluminavam as frestas das persianas. Sabia, no entanto, que suava frio e ouvia os escarros da velha, no quarto contíguo. Puxava um cigarro, certamente, ouvindo vozes, como de hábito. Doía-me sua solidão, suas horas contadas sem futuro. Mesmo que ouvisse suas histórias na infância, não me furtava em ouvi-la ainda hoje, embora desandasse em enfadonha canseira. Não tinha o que fazer com ela, a não ser esperar que se escoassem os dias, as noites, o tempo que lhe restava. Levantei-me devagar e espiei pela porta entreaberta. Estava como eu pensava, mascando aquele cigarro velho, babado, queimando os dedos, do que restava de chama. Aproximei-me, cauteloso, entre as aves empalhadas que simbolizavam a sua mais torpe herança. Avisto-a com pesar. Me parece aflita. Olhou-me por baixo dos olhos quase ocultos nas bolsas enegrecidas. Desviou-os rápido, como se quisesse esquecer de vez, a minha figura. Perguntei por q