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Mostrando postagens com o rótulo rotina

Loiralice, o Opala vermelho e o futebol

Eu e meu amigo Saulo inauguramos nosso desejo de assistir um grande jogo de futebol. Acostumados com os times pequenos de nossa cidade, assistir Grêmio e Corinthians era uma verdadeira odisseia. Uma marca em nossa carreira de torcedores, que na época, antes das desilusões derradeiras, éramos fanáticos. Saulo era um sujeito estranho. Gente boa, grande amigo, sempre disposto a apoiar em qualquer situação difícil, mas tinha uma conduta peculiar que  chamava à atenção. Eu não conseguia convencê-lo de que as suas atitudes eram inadequadas, pelo menos, pois sempre dava um jeito de dar outro rumo à conversa. Uma de suas extravagâncias, era a mania de interpretar papéis que destoavam de sua rotina. Se participávamos de uma reunião de jovens da igreja, ele demonstrava estar em êxtase, perdido nos trâmites iluminados do divino, ascendo à postura angelical, quase um santo. Mas quando estávamos juntos, toda a encenação se dissolvia e se transformava no jovem de classe média, com

A VISITA

Chegar a casa, percorrendo as ruas estreitas, de paralelepípedos irregulares, batida incerta no peito, olhos febris. Difícil saber o significado da visita, entender a expectativa da hora, o aperto de mão. Minha mão na do meu pai, caminhando orgulhoso, torcendo os pés nas pedras incólumes. Tropeçando, olhos pairando nos céus, gestos hesitantes, braços indagando inquietos. Segui-o em tudo, até na incerteza. Tinha de fazê-lo para chegar lá. Saber como o tal tio nos receberia e ter ao mesmo tempo a convicção do acolhimento sereno. Muito se falava nele. Meu pai tinha orgulho da sabedoria, da linguagem precisa, do seu amor pelas letras e filosofia. Eu divagava, mão apertada, coração aos saltos. Via as sombras das pernas longas de meu pai no sol da calçada. Os pés grandes, apressados. Se soubesse o quão distante seria o caminho, talvez não me levasse. Mas valia à pena o sacrifício para transmitir conceitos saudáveis que talvez eu apreendesse. Agora sei que ele estava certo, porq

O verão de nossos dias

Ilustração: pintura da artista Evanoli Resende Corrêa Tanto se fala no verão. No sabor das águas, no saborear da brisa, quando não dos ventos do Cassino. Acima de tudo, o bate-papo com os amigos. Verão é isso. Jogar conversa fora, sem muito compromisso. Talvez seja mais do que um andar ao léu, ou margear a praia de bicicleta nos fins de tarde. Ou como diz Vinícius na música, “um velho calção de banho , o dia pra vadiar”. Talvez seja mais do que conversar sem compromisso. Talvez seja mais do que lagartear ao sol. Talvez seja apenas viver. Viver plenamente, o que, às vezes, deixamos de fazer durante o ano. Claro que não se quer um tempo exclusivo de fazer nada. Mas um tempo pra nós mesmos, onde nem nos olhemos tanto no espelho, nem nos preocupemos tanto com a sandália gasta. Mas um tempo para ler aquele livro que prorrogamos sem a devida atenção, e que sempre nos vem à memória. Um tempo para nos dedicarmos à natureza. Para pormos em prática a tranquilidade dos dias. Para es

O DOCE BORDADO AZUL - 14 º CAPÍTULO

Todas as terças-feiras e quintas publicarei capítulos em sequência do romance "O doce bordado azul". A seguir o 14º capítulo. Capítulo XIV As alucinações de Laura Abrir os olhos devagar, sentir o corpo debilitado, como se não pudesse levantar-se, sem ânimo para nada, a não ser ficar quieta, em posição fetal. Mas aquela luz que insistia entre as frestas das cortinas não a deixavam esquecer-se do início do dia, ou do fim, não sabia bem distinguir. Quando viu a figura da mãe, à porta do quarto, fechou deliberadamente os olhos. Artifício providencial, imediatamente percebido. Laura perguntou se não se levantaria, as horas passavam, a tarde chegaria logo. Não poderia dormir o dia todo. Lúcia, como uma adolescente em dia de prova, encobriu a cabeça com o lençol, resmungando, exigindo que se afastasse dali, que a deixasse morrer. Mas não era possível, embora Laura saísse do quarto, sem antes informar que logo, logo teriam visitas. Que ameaça terrível significava aquela in