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sábado, março 03, 2018

O que Saint-Exupéry, um amigo e as redes sociais tem a ver?

Há muitas coisas que nos chamam a atenção, quando participamos de redes sociais como o facebook, o twitter, o Snapchat, Instagram, entre outras. Por exemplo, há pessoas que conhecemos ou não e que compartilham assuntos de mesmo interesse, como no meu caso, a literatura, a política, filmes, músicas, ciências da informação, com ênfase em biblioteca, os livros enfim.

Não sou muito dado a bate-papo online, nem participar de redes de orações, discussões religiosas, jogos, nem muito menos expor coisas muito íntimas, como por exemplo, um beijo apaixonado em minha mulher (porque se já foi fotografado, por certo, feito alguma pose e publicado na rede) então, já este beijo não é tão espontâneo assim, é meio dramaturgia, não é mesmo? Claro, que ocorrem os flagrantes e isso é legal. Mas falo daqueles encontros arrumadinhos, tudo muito certinho e o beijo tascado de forma cinematográfica. Ah, isso é engraçado.

Há coisas intimas também, como um jantar em família, na alegria em estar com a família num passeio ou ou viagem. Acho saudável, claro respeitando os limites da soberba e da ostentação. Mas não estou aqui para julgar ninguém, muito menos para criticar os inúmeros integrantes das redes sociais, inclusive os meus amigos.

Por outro lado, sei que no dia a dia, quando topo com uma pessoa com dificuldades físicas, e às vezes, um certo atraso em demonstrar o que desejam expressar, fico um pouco impaciente. É um defeito meu, é claro, já que devia ser mais tolerante, principalmente porque todos, sem excessão, inclusive eu, somos cheios de dificuldades, ou psíquicas, ou em virtude da idade avançada, ou da pouca idade, ou dos comportamentos rígidos assimilados, das inseguranças, ou mesmo da arrogância, da autoestima exacerbada, da intolerância, enfim, todos temos algum tipo de inquietude em relação aos valores e atitudes dos demais. Ninguém é perfeito.

De todo modo, está claro que não sou paciente, mas também não sou intolerante. Sou uma pessoa que espera, espera que a outra mostre a que chegou, e sem nenhuma superioridade interior, tentar me aproximar e ser o mais natural possível. Não quero exercer o papel de juiz, nem professor ou qualquer personagem investido de poder e segurança para mostrar quem é o melhor. Desta forma, evito demonstrar minha impaciência e respeitar o tempo e o limite do outro.

Falo isso, porque fico me perguntando sobre uma pessoa que vem a minha casa, pelo menos uma vez no ano, nos verões, quando vem ao Cassino.

Na verdade, eu o conheci através de outras pessoas, e nem tinha motivo de ser seu amigo, apenas procurava ser gentil e educado nos poucos encontros que tivemos em comum com outros conhecidos. Via de regra, vem no meu aniversário, mesmo que não seja convidado. Não reclamo, já acostumei com sua presença e sei o quanto é sincero. Uma vez ao ano, quando vem também me convida (eu e minha família, para um churrasco especial, que faz somente para nós). Fico pensando no motivo de tanto desvelo, uma vez que não é meu parente e a amizade, para ser sincero, começou quase em via única, do lado dele, porque para ele, parece que há um lastro que consolidava uma amizade eterna. Não que eu o dispense, ao contrário, sempre o trato com a maior sinceridade e gentileza, mas somos pessoas tão diferentes, que se torna extremamente difícil uma conversa entre pessoas com objetivos tão distintos. Se eu fosse um cara extrovertido, talvez ele tivesse motivos para me procurar.

Ao contrário, sou meio quieto, e essa característica se acentua em virtude das dificuldades em que ele apresenta em desenvolver os assuntos. Jamais poderia falar nos temas que me interessam com ele, pois somente concordaria com um ãh ãh absorto, provavelmente olhando ao longe, perdidos em seus pensamentos.

Via de regra, seus assuntos prediletos referem-se ao celular de última geração que acabou de comprar, do carro ano 95 que está tinindo de novo, do último DVD da banda de pagode, das fotos dos sobrinhos, dos passeios que faz na praia e do exame destes assuntos meia hora depois, repetindo tudo de novo. O interessante é que ele sabe de cor qualquer dia do ano em que tenha feito uma compra, como por exemplo comprou um aparelho toca-discos 2 em 1, com prato para LP, toca-fitas e rádio am fm, nas Lojas Colombo, no dia 19 de abril de 1988, dia do Índio. Ou a TV preto e branco de 21 polegadas, da marca Philco nas lojas Manlec, em 1982, no dia dos namorados.

Por isso, não esquece jamais as datas de aniversário, inclusive, a minha (e olha que não havia facebook, quando o conheci).

Acabo, ficando na estratégia de perguntar em círculos sempre a mesma coisa, que lhe diga respeito e intervir com um detalhe ou outro sobre mim, que também possa sugerir algo referente a ele.

Por isso, indago a mim mesmo e aos que me conhecem, por que ele sempre me procura com esta absoluta sinceridade, que embora apresente um certo egocentrismo, sempre procura me agradar de uma maneira ou de outra, ora convidando para um churrasco, ora trazendo as fotos que tirou num dos aniversários para mostrar, ora trazendo um DVD para assistir, mesmo que não seja o meu gênero preferido, mas que imagina, com convicção infantil, que me alegrará sobremaneira.

Por estas e por outras, sem querer propalar meus bons sentimentos, talvez seja exatamente isso, essa maneira honesta de ser, sem vislumbrar meus interesses pessoais, sem me importar com as horas que vão naquele mate de vai e vem, sem ouvir muito mais do que o silêncio.

Talvez seja um ato de doação. Mas não é só pra ele, é para mim também, no momento em que me dispo um pouco do que sou e fico mais próximo do ser humano. Afinal, ser amigo também é uma qualidade humana. Acho que é isso. Não ter muita paciência e às vezes, até procurar, disfarçado, as horas no celular, ocorre sim, mas a diferença é que o aceito como é.

Muitos que o conhecem, o tratam como um idiota, como uma criança a quem se dá ordens e se exige pouco para não encher o saco.

Pelo contrário, procuro sempre ressaltar as suas qualidades, incentivá-lo a melhorar em seus projetos, talvez medíocres para a maioria das pessoas, mas que para ele, são grandiosos, como tirar a carteira de motorista para dirigir o carro que comprou.

Não lhe dou conselhos nem faço ressalvas em suas atitudes. Ouço o que tem a dizer e dou a minha opinião, sem muitas reservas. Procuro falar das coisas que lhe dizem respeito, e acrescentar-lhes um frescor que normalmente não teriam, por mais simples e banais que possam parecer. São coisas suas. É a sua vida. Por isso, acho que intui uma certa cumplicidade com a sua percepção de vida.

Mas voltando às redes sociais, como no início da crônica, observo que algumas pessoas que conheço (ou assim acredito) demonstram qualidades completamente estranhas em seus seus perfis públicos, a ponto de pensarmos que se trata de outra pessoa completamente diferente.

E fico me perguntando, será que eu estou equivocado? Que elas são exatamente como aparecem na rede e que na vida real não passam de um produto de minha imaginação? Nem sei se há uma intenção de exibirem uma personagem diferente ou se acreditam que a persona que criam é a sua realidade interna. Quem sabe, uma inspiração para uma vida melhor? Um upgrade de mais qualidade?

Afinal, todos somos enigmas, até mesmo para nós mesmos. Temos cavernas escuras em nossas mentes que não mostramos para ninguém, até mesmo para nós mesmos. E o quando o fazemos, tomamos um choque e juramos de pés juntos que foi tudo um sonho. Que é obra do destino ou da manipulação do terapeuta.

Entretanto, afundado em minhas próprias cavernas e a cada dia, tirando um pé, pra chegar no claridade do dia, procuro mostrar minhas preferências, sem me preocupar muito com a aprovação alheia. Claro que fico muito satisfeito que curtam e comentem o que publico, mas fico feliz com opiniões diferentes das minhas, pois ao declararem, estes estão sendo sinceros, como sou com aquele amigo, sem quererem me agradar simplesmente. Neste caso, a discussão proporciona um pluralismo de ideias interessante. Mostro claramente que sou de esquerda, mais especificamente socialista, que assumi de acordo com minha visão de mundo, dos valores que apreendi.

Afinal, como diz Cazuza, todos precisam de uma ideologia pra viver. E cada um tem a sua. Que bom que seja assim.

Respeito os que pensam diferente, critico, discuto e aceito as críticas. Há casos, afinal, sou humano, que procuro ocultar as publicações alheias e comentários, pois para a boçalidade, não há argumento.

Por outro lado, exerço o meu gosto pela literatura e faço da escrita o meu ritual diário. Também adoro viajar e de vez enquanto, publico alguma coisa que lembre as viagens que participo. Cenas que considero curiosas ou bonitas. Também falo alguma coisa em música e os que virem meu perfil, percebem que gosto muito do Chico e que procuro assistir seus shows. Além disso, gosto de filmes, principalmente os que tem conteúdo dramático e faço algumas resenhas nos meus blogs. Falo um pouco em espiritualidade e para isso, devo estar focado numa emoção religiosa para expressar alguma coisa, porque prefiro não repassar nada em que não acredite.

Às vezes, sinto que sou um chato, porque insisto em alguns assuntos, como o horror à ditadura e por isso, sou muito cobrado e criticado. Mas tudo bem, se não me mostro como sou na realidade, pelo menos não douro a pílula, me mostrando um santo no altar do facebook.

Por isso, fiquei pensando neste meu amigo, cujas dificuldades físicas e neurológicas, não o impedem de exercer as suas tarefas com muita competência. Nesta pessoa que confia em mim, e que tento ser paciente, aceitando-o como é.

Em razão disso, lembrei de um livro que a maioria dos adolescentes de gerações passadas leram: "O pequeno príncipe" de Saint-exupéry. Quando o li, me impressionou o modo como o autor descrevia as relações humanas sob imagens metafóricas, através da raposa, da rosa, do príncipe de outro planeta, do geógrafo, do bêbado. São pessoas em absoluta solidão, que finalmente se deparam com o sentimento, assim despertado pela raposa, que diz ao menino, a frase tocante, que expressa o real significado da vida. "Os homens esqueceram a verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer”.

Através desta lembrança, tive um pequeno insight, que não é nada original, mas que centenas de pessoas já devem ter experienciado em nas suas relações com o próximo. Todos querem ser cativados, de alguma maneira. Na redes sociais, nas festas, nos encontros, no dia a dia, até mesmo nas relações quase imperceptíveis do comércio, onde estamos via de regra preocupados com o produto e o comerciante com a própria venda.

A raposa queria ser cativada. E o que fazer, perguntou o Pequeno Príncipe. "Você deve ser muito paciente. Eu não preciso de ti.Tu não precisas de mim. Mas, se tu me cativares, e se eu te cativar…ambos precisaremos um do outro. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."

Saint-Exupéry sabia dessas coisas. É só preciso paciência.

segunda-feira, julho 10, 2017

O despertar do brinde

Saber como se adequar às coisas, como se apropriar da vida, como sobreviver. Poderiam ser frases de um reality show de desafios, mas nos dias em que vivemos, parece que os desafios são mais reais e incongruentes do que qualquer programa desse gênero.

As pessoas já não se encaram, nem mesmo quando estão do outro lado do balcão. Basta-lhes a tela do computador ou o visor do celular. Buscam, pesquisam, navegam, incluem números e documentos e quase não se olham. Um trabalho qualquer numa loja é suficiente para se observar estas facetas dos funcionários, bem como dos clientes.

O sistema é o deus onipotente de qualquer trabalho. O sistema abrange desde a contabilidade das empresas e bancos, até o humor dos empresários ou do passante distraído na avenida. Mesmo no transporte, não existe nada mais importante, nem mesmo os sinais de trânsito do que o gps e o celular.

Isso sem falar nas redes sociais. Ali tudo é possível, a mídia virtual manisfesta a todo o momento as necessidades mais urgentes ou menos importantes dos usuários.

Por um momento, penso, como nos apropriarmos de nós mesmos, das coisas que observamos na rua, da natureza, das construções antigas, da beleza das fortalezas, dos faróis, dos mares, dos navegantes, do povo.

Como nos adequarmos ao simples, ao verdadeiro e real? Como ver apenas, sem registrar para os outros, como assistir o show com a intensidade de sua perfomance, sem lançá-lo instantaneamente para o mundo através de milhões de bites, sem aproveitá-lo na íntegra?

É agradável mostrar aos amigos os nossos prazeres, como viagens e festas, mas de um modo tranquilo, registrado sem perder o momento, a espontaneidade da alegria, o despertar do brinde.

Que brindemos à experiência da vida e somente a partilhemos num registro posterior.

Viver é experienciar no ato.

segunda-feira, maio 22, 2017

Garrafas ao mar

Uma garrafa pode conter muitas coisas, além do líquido, do rótulo, da tampa, pode conter por exemplo, um segredo.

Quem não tem vontade de mandar para outro continente, quem sabe, uma garrafa contendo algo estranho, como um bilhete.

E se a garrafa atirada ao mar, trouxesse boas vindas de um tempo muito antigo, tantos anos atrás, que já nem reconhecêssemos o objetivo, o texto carcomido, com um letreiro cheios de esses e efes, quando se pediria apenas vogais. Palavras esquisitas, desejos tão inocentes que não mais teriam significado nos dias de hoje.

Porém é uma garrafa que vem com um bilhete dentro e nos traz alvissareiras mensagens. É o que pensamos. É o que desejamos.

Mas e se essas mensagens não passem de apenas um desejo individual?

Como por exemplo, que o mundo saiba que em 1920 alguém comprou o seu primeiro automóvel e percorreu 35 km, a maior distância já percorrida por um carro numa estrada de carruagens?

Talvez não significasse nada. Talvez apenas um regalo para quem mandou e uma notícia blasé para quem recebeu.

Nos dias de hoje, somos levados a experienciar apenas o que nos permite ter importância, e que participemos dessa magnitude.

Não temos o romantismo e a ilusão de outrora.

Talvez não mandássemos garrafas ao mar e se o fizéssemos seria talvez como um artefato bélico que explodiria e lançaria milhares de chamas para alegrar nossas mentes deterioradas.

É, não se tem mais a ilusão dos bilhetes, nem se espera qualquer segredo, pois eles não existem mais nas redes sociais.

E se existem, servem apenas para delatar quem participa dessas mesmas redes e achincalhar o seu perfil.

Garrafas ao mar, jamais. Sonhos jamais. Apenas o cobre desairoso de nossos petardos.

quinta-feira, janeiro 12, 2017

Criei um fake

Criei um fake

Certa vez criei um fake de mim mesmo. Isso é normal, me perguntaram alguns amigos, não sei, nem mesmo sei o que realmente pode ser considerado normal. Afinal, as pessoas apresentam comportamentos distintos das normas concebidas como dentro da normalidade e tudo parece extraordinário, elegante, vanguardista, até pós-moderno (se é que isto existe).

Enfim, tudo depende do contexto em que se insere a situação ou o comportamento.

De todo modo, por um tempo, fui muito feliz com o meu fake, ou melhor, fui contemplado com alguns benefícios.

O meu fake participava de muitas redes sociais. Era esperto, inteligente, adequado às novas tendências tecnológicas e artísticas, além de ser politicamente posicionado, e no final das contas, um grande filósofo.

Mas era um fake, uma figura criada para me proteger, como uma bengala para me amparar, um personagem para dividir comigo as informações mais estrambólicas, para discutir os problemas sociais, para compartilhar as dúvidas existenciais, para tomar atitudes objetivas em relação aos mais diferentes pontos de vista. Sim, porque ele tinha um ponto de vista.

Ele possuía assertivas bem argumentadas, sabia expor suas ideias com incomparável maestria. Era um verdadeiro gênio na arte de examinar, avaliar, abalizar, confrontar situações, encontrar as mais diversas saídas e intervir despudoradamente nas conclusões de outrem, mostrando outros caminhos, outras maneiras de olhar o mundo. Olhares diferentes não lhe faltavam. Alegria e bem humor também. Era perfeito. Educado. Paciente, paciencioso, parcimonioso, contemporizador, elegante. Um gentleman.

Por um tempo, eu o acompanhei em suas elucubrações, suas ideias diversificadas, seus pontos de vista únicos, que fogem do senso comum e desacomodam as coisas.

Afinal, do alto de seus amplos conhecimentos, de suas vivências e sua atribulada trajetória mundana, espraiava pelas cercanias toscas das redes sociais, as mais amplas doses de novas descobertas, de novas maneiras de situar as lacunas, enchendo-as com experiência, conteúdo e ação.

Eu me acostumei com ele.

Habituei-me com o seu jeito de retribuir o que eu pensava, de compartilhar comigo as descobertas, de sinalizar os mesmos caminhos, de alargar horizontes que ao mesmo tempo nos pareciam tão próximos, tão atingíveis que bastava que esticássemos a mão, aquele dedo indicador, aquele que julga, que aponta, para chegarmos mais e mais perto, do objetivo alardeado, quem sabe da verdade.

Era assim que nos comportávamos quase arrogantes. Um entregando ao outro, de mão beijada, a contribuição precisa no momento certo. Como num jogo de dupla, onde um depende do outro. Jogo de tênis, preciso, tenso, concentrado, silencioso. Só o barulho da raquete, do suspiro da plateia, do grito de vitória.

Uma coisa que brilhava no céu empoeirado e nublado do facebook ou de qualquer outra rede social. Qualquer coisa que disséssemos valia milhões de acessos, por nós, é claro, que não estávamos interessados em frases de Arnaldo Jabor [sic], em comentários sobre bebida, cozinha, aquele churrasquinho íntimo, lavado na caipirinha e nos olhares vermelhos e estrábicos de quem abusou da alegria, coisas que só dizem respeito a quem posta na rede, ou na moto usada, no cachorrinho fazendo xixi no sofá, na sogra esticada na rede, mostrando as coxas disformes, ou nas mensagens melosas, instigando culpas e medos, procuras e respostas de correntes intermináveis.

Não, não era nada disso que procurávamos. Isso era coisa do falecido Orkut.

Mas, de repente, o fake foi sendo conectado por outros amigos, foi sendo abordado em pedidos de amizade, de compartilhamento, e cada vez mais assediado por suas ideias e manifestações impunes.

Todos queriam conhece-lo, saber mais do seu perfil, pesquisar suas fotos, seu mural. Queriam acompanha-lo, segui-lo, encontrar nele o caminho que parecia abrir tantas portas, tantas saídas e tantas maneiras de achar a verdade.

Nem todos, é claro. Não aqueles da caipirinha, das fotos pessoais, da mostra diária de seus afazeres, desde a comida do meio dia até a dor de barriga da tarde. Estes não. Estes estavam interessados em curtir outra coisa e compartilhar consigo a mesmice do dia a dia.

Aquela novidade era pra poucos.

Mas estes poucos iam se multiplicando, o que me deu algum medo. Medo de ser ultrapassado pelo fake.

Os meus amigos já nem me ouviam mais, nem compartilhavam o que eu postava, embora concordassem comigo, ah, só porque eu compartilhava com o fake, concordava com o fake, alimentava-me do fake. Eles queriam fazer o mesmo.

Foi um tempo de muito sofrimento. Uns diziam, porque que ele só compartilha contigo? Por que só concorda contigo? Porque descreve em pormenores, com muito mais argumentos, alicerçado em artigos de especialistas, em leituras adequadas, em conhecimentos científicos ou em suas próprias vivencias o que tu enuncias? Por que não colabora conosco, não compartilha conosco?

Então tive que dividir o fake. Ou melhor, tive que escrever por ele para os amigos também.

Então começara a chover  pedidos para acrescentá-lo em suas redes sociais.

Eles o queriam, eles o amavam.

Não era a mim que seguiam, não era o que eu pensava que valia, era o que ele afirmava, eram as suas atitudes que importavam. Ele era o rei da festa. Eu passei a ser só um coadjuvante.

Então tive uma ideia: decidi eliminar o fake.

Resolvi dar um basta naquelas atitudes arrogantes, naquele modo de pensar vanguardista, pós-moderno, aqueles pontos de vista avançados, aquele jeito ousado de fugir do senso comum.

Eu precisava eliminar o fake. Acabar com ele, acabar com sua fama, seu jeito desinibido de ser, sua intimidade cada vez mais exacerbada junto aos meus amigos, que agora eram mais seus do que meus.

Não havia saída. A única saída era acabar com ele.

Foi o que fiz.

Eliminei o fake.

Voltei a ser eu mesmo. A discutir os mesmos assuntos, a política, a sociedade, os movimentos sociais, a beleza da natureza e a luta por sua conservação, a busca pela igualdade étnica, a luta pelo fim dos preconceitos, a filosofia em suas mais diversas vertentes, a música clássica, a boa musica, o teatro, a literatura, a vida cultural... Também fugi do senso comum, vi e revi valores, avaliei outros caminhos...

Os amigos se afastaram, um que outro postava um “curtir” ou compartilhar alguma foto ou desejar uma boa noite, um bom dia, um boa tarde, um bom fim de semana...

E todos voltaram a mostrar as suas casas bonitas, recém-adquiridas, os seus carros último modelo, as suas motos, os seus casacos de couro, os seus churrasquinhos de fim de semana...

Enfim, a mediocridade que faz parte de suas vidas.

Acho que vou criar o fake novamente. 

sexta-feira, novembro 20, 2015

O elo do encontro

Tento prestar atenção em cores, janelas, platibandas, casas antigas restauradas ou em ruínas. Memórias que ficam ou apenas o passado depojado de sua história. Na história que produzimos, talvez as memórias não resistam ao próximo bafejo da moda.

Ando pelas ruas e observo as casas e pessoas na sala de jantar ocupadas em nascer e morrer, como no Panis Et Circenses dos Mutantes. Na verdade, agora ocupadas em revelar no intervalo, a vida que vaza rápido pelas entranhas das vidraças. Vidraças das redes sociais, das fotos instantâneas, dos vídeos do celular, dos olhares importunos. Um selfie a qualquer custo, na vida ou na morte. Importa é revelar.

Ando pelas ruas e vejo as crianças metidas em carros blindados, perdidas nos tablets, em joguinhos não tão inocentes. Ando pelas ruas e observo os meninos já não tão meninos, fazendo o próprio jogo de polícia e bandido, armando-se na aprendizagem cotidiana de seus pares não tão parceiros assim.

Ando pelas ruas e vejo o mar se abrindo na borrasca de nossos processos escusos de desapropriação da natureza, empresas que descarregam veneno transformando em sarjeta o cenário da vida. Vejo as pessoas jogarem as sobras de seus acúmulos, alterando a lagoa, fechando comportas, produzindo enchentes.

Tento prestar atenção em cores, na natureza, na vida que se insurge nos meandros de nossas escolhas visuais, mas me aquieto e me afasto, temendo que ora acabe a beleza observada.

Passo pelas igrejas, pelas escolas, pelos parques. Não ouço porém, os cânticos acolhedores, nem as preces fervorosas. Nem as crianças em bandos, alcançando esquinas, fazendo dos momentos livres, as brincandeiras do encantamento. Vejo-as correndo para os carros mal estacionados como se temessem a vida. Nem os adolescentes disputando espaços nos caminhos arborizados, conversando e rindo como se a vida se reduzisse em seus desejos. Vejo-os afoitos em suas mochilas e celulares, buscando a última conexão com o mundo.

Quem sabe um dia, as ruas se encham de cores de todos os matizes e os temores, as ameaças, o racismo e todos os ismos que afastam o ser humano desapareçam? Quem sabe o homem se integre à natureza e a defenda, revendo assim os seus princípios? E quem sabe a proximidade com o outro seja o elo principal do encontro?

Foto do artista, poeta e escritor Wilson Fonseca.

quarta-feira, junho 03, 2015

A política e os palpites

Às vezes, me pergunto o que dizer em relação aos inúmeros posts que vejo nas redes sociais, especialmente no facebook. Na verdade, não há muito o que dizer: há a verdade de uns e a verdade de outros. Principalmente, no que se refere à política, as pessoas escolhem seus artigos ou piadas, ou mensagens, de acordo com a sua ideologia política ou mesmo a falta dela. Infelizmente, não há um consenso na maneira de exporem os fatos. Claro que nao vá se esperar que se pense de forma padronizada, mas que se pense observando os dois lados, examinando os vários â
ngulos e as diversas hipóteses para os dados. E por fim, deve-se contextualizar o que se afirma. De todo modo, há divergências em todas as discussões, o que é sadio e natural. Entretanto, não se deveria apenas publicar temas que foram interpretados por outrem, manipulados de acordo com a ingerência do interesse pessoal ou institucional. Dever-se-ia pensar no bem comum, na realidade que abarcasse todos os pontos de vista ou pelo menos que contemplasse as visões de cada um moldadas na verdade, nos conceitos maturados e discutidos de determinado assunto. Esperemos que as coisas melhorem, que as pessoas analisem mais detidamente os temas que dão seus palpites e que não entrem na rotina dos manipuladores, seja de um lado, quanto de outro. Vamos esperar.

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