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sábado, outubro 01, 2016

A fotografia de Santa - CAP. 7

No sexto capítulo, com a revelação da proposta de Santa à família e suas condições, todos começaram a questionar-se descobrindo as falhas uns dos outros, ou mesmo deixando vir à tona tudo o que pensam. A preocupação principal é conhecer as mensagens que todos receberam. Letícia, indignada pela traição do marido e brigando muito com os irmãos, exige que todos revelem as mensagens que receberam. Chegamos agora ao nosso 7º capítulo de nosso folhetim dramático. Divirtam-se como dizia o poeta, porque hoje é sábado.

Capítulo 7

Fonte da ilustração: https://morguefile.com/search/morguefile/18/library/pop. autor: TheBrassGlass

Alfredo que se afastara do grupo após estar na berlinda, dirige-se à mãe, com frieza.

— Faltam apenas o bispo e Linda. Sabe, mamãe, eu não entendo o que a Linda tem a ver com esta história.

Santa aproveita a oportunidade para deixar claro o seu objetivo. Parece mais forte do que toda a repercussão dos acontecimentos. Dirige-se a Alfredo, com estudada segurança.

— Se Linda quiser contar, vocês saberão. Sabe, meu filho, sua irmã não soube interpretar o que eu pedi a você. Ela está desequilibrada e está vendo tudo aos extremos.

— Tem certeza de que a desequilibrada sou eu? – pergunta, encarando-a com ódio.

Mas é Alfredo que responde num tom de extrema emoção, tão sofrido e amargurado, que talvez fosse a única observação que fizesse Santa rever o seu pedido. Nada, no entanto, pode impedi-lo de expressar toda a sua revolta.

— Não se preocupe, comigo mamãe. Sei muito bem o que a senhora quis dizer. Eu sempre senti nos seus olhos uma acusação permanente. Eu sempre soube da sua desconfiança, inclusive, porque não conseguia esconder no próprio tratamento que me dispensava. Às vezes, mamãe, a senhora era rude, fria, quase cruel. Não queria que eu chorasse como uma meminha, lembra? Não admitia que eu brincasse com as meninas, que tivesse outros interesses do que jogar bola. Eu sempre senti sobre mim o peso do seu olhar. Ele sempre queria me dizer alguma coisa, uma acusação, e eu estava sempre em pecado. Cada pensamento era um pecado, cada gesto em direção ao meu sentimento, era um pecado, uma punição.

— Por favor, Alfredo, pare, não continue meu filho. – termina a frase num resmungo choroso.

Ele, entretanto, soma forças para prosseguir com mais ímpeto:

— Por que mamãe? Agora não lhe interessa mais a minha exposição? Foi a senhora que botou na roda que eu... eu tenho dificuldades.

— Todo mundo sabia que ele era veado – avalia, Ricardo, tentando falar baixo no ouvido de Letícia.

Tavinho, no entanto, ao ouvir o cunhado, o recrimina, com raiva:

— Cala boca, Ricardo, eu te quebro a cara!

— Deixa, Tavinho. Parece que ele tem razão. Uma pena que eu nunca fui um veado verdadeiro, nunca assumi a minha homossexualidade. Eu sempre me esquivei destas tentações, eu nunca, se você quer saber, mamãe, nunca eu tive um relacionamento mais íntimo com um homem. Só me puni durante toda a minha vida, vivendo à margem, taciturno, alienado da sociedade, dos grupos. Um homem solitário.

— Santa suplica, aos prantos:

— Pare pelo amor de Deus, você não precisa agir dessa forma, Alfredo. Você não tem que se expor dessa maneira sórdida! Você não precisa se humilhar, meu filho!

— Mas a senhora precisa saber. Tudo que eu tive foram aquelas brincadeiras de criança, nas quais até mesmo os héteros se envolvem. Não, eu apenas sonhei, fui um gay platônico, que nunca se assumiu, que nunca admitiu se assumir.

— Mas então, você é homem – reflete, Sandoval, desajeitado, tentando inferir alguma observação, sem sucesso.

— Claro que sou. Não se preocupe, quanto a isso. Só a minha orientação sexual é diferente. Mas já que eu me mostrei aqui, do modo mais sincero e corajoso, acho que todos devem fazer o mesmo e assumir o que são. Não interessa se é errado ou certo. Somos uma família, não somos? Não sei, se alguma vez esta família existiu, mas em todo caso, continuamos todos juntos, convivendo quase que diariamente. Até mesmo o bispo Martin. O senhor pode nos dizer qual é a sua mensagem?

O bispo olha para todos, perguntando a si mesmo, se chegou a sua hora. Tenta divagar, devolvendo ao próprio Alfredo as suas observações. Começa com voz baixa, alternando aos poucos, até se tornar uma espécie de discurso.

— Bem, Alfredo, eu admiro muito o seu comportamento, afinal você mostrou que está inserido neste grupo familiar, por mais revolta que tenha, você ama esta família, por isso foi tão sincero. Mas lembre-se, você é um menino bom, não é nada disso que pensa. Eu conheço você e sei o que estou dizendo... – faz uma breve pausa – No meu caso, eu não posso, de modo algum me considerar da família, portanto, não tenho muito a dizer.

— Ah, tem sim, o senhor foi convidado como todos nós – extrapola Letícia, empurrando o braço de Ricardo que tenta segurá-la, ainda fingindo um olhar carinhoso.

Sandoval, ratifica a objeção da filha, interessado.

— Letícia, tem razão, Bispo. Se minha mulher fez questão de convidá-lo, acho que nada mais justo do que pôr as cartas na mesa. – e completa, malicioso – Chegou a sua hora.

— Meu amigo Sandoval, não vamos considerar este nosso encontro, um jogo, sem qualquer alusão … o senhor sabe. Aqui não se trata de um confronto, muito pelo contrário, é uma reunião para que encontremos o melhor caminho.

O bispo encerra a frase, fechando as mãos em posição de oração, pousando delicadamente o queixo, como se não esperasse mais nada do encontro.

Tavinho, porém, faz questão de mantê-lo na conversa:

— E qual é o caminho que a Virgem lhe sugeriu?

— Não vamos colocar o nome da Virgem nesta conversa, Tavinho. Você sabe, que eu sempre fui amigo da família, afinal, eu os batizei a todos. Sua mãe...

— Deixe de enrolar, bispo. Abra o jogo – Tavinho o interrompe, impaciente, enquanto Ricardo complementa – Eles sabem fugir pela tangente.

O bispo suspira longamente. Sabe que a melhor estratégia é dizer a verdade, ou seja, igualar-se a todos e dizer o motivo de sua mensagem. Suas mãos suam e a voz estremece, de vez em quando.

— Bem, se vocês insistem, eu não posso fugir da minha participação, digamos, nisso tudo. Se estou aqui, como vocês disseram é por que a nossa querida amiga Santa me convidou. Acho mesmo que é devido a me considerarem quase da família... – Santa desta vez, o interrompe, ansiosa – Por favor, Bispo Martin, esclareça a todos o que lhe foi destinado.

— Está bem, Santa, é justo, é justo. Na verdade, é uma coisa simples e ao mesmo tempo, complexa. Trata-se da bússola, que doei à Santa no dia de seu aniversário.

— Diga a procedência da bússola, sr. Bispo – insiste Sandoval, que parece mais interessado do que os demais na história.

— Claro, amigo Sandoval. Eu explicarei tudo e espero sinceramente que não tirem conclusões precipitadas. Na verdade, a bússola originalmente, era da mãe de Sandoval, Dona Maria Marta de Medeiros e Quental.

— E como foi parar nas suas mãos? – Sandoval grita, impaciente – Como explica aquela história de ser doada à igreja no dia do batismo de Santa?

— Deixe-o concluir, Sandoval – reitera Santa, aborrecida.

O bispo reinicia, num tom um pouco mais baixo e temeroso:

— Bem, eu era muito jovem, quando a mãe de Sandoval também era uma jovem senhora. Perdoe-me Sandoval, eu sei que é um fato muito desagradável para você, eu entendo perfeitamente e para mim, uma mancha terrível. Mas, como vocês bem me alertaram, eu preciso falar. Já que chegamos a esse ponto, não há como recuar. Bem, como eu dizia, ela, a mãe de Sandoval participava muito da comunidade... oh, meu Deus, é tão penoso para mim.

— É difícil para todos, Bispo – acrescenta, Alfredo.

— Sim, Alfredo – e dirigindo-se à Linda, que não se afastava da cadeira onde sentara desde que começara a reunião – Por favor, traga um copo d'água para este velho discípulo do Senhor. Eu já estou muito velho, não tenho saúde suficiente para me ocupar de coisas tão complicadas. Mas se a Virgem me concedeu esta oportunidade, preciso levar à frente. – fez um pequeno silêncio e prosseguiu – Como eu disse, eu era muito jovem e dona Maria Marta era uma mulher muito bonita.

— Cara de pau. Pegou a velha! – exclama Ricardo, sorrindo irônico, calando-se logo em seguida, com a xingação de Letícia – Cale a boca, imbecil. Eu não esqueci o que você fez!

O bispo segura o copo de água, que Linda trouxera, com as mãos trêmulas. Toma um gole, aproxima-se da mesa de tampo de vidro, larga-o e pede licença para sentar-se.

Todos se aproximam, fazendo um círculo, em silêncio.

Ele então, senta-se, tentando refazer-se de um possível mal-estar. Por fim, recomeça:

— Bem, amigos, continuando. Nós tivemos um breve caso, uma coisa passageira, da qual me arrependi por todos os meus dias. Mas, daquele pequeno relacionamento, ficou uma joia, uma joia que ela me doou de despedida. A bússola, que vocês agora conhecem. Esta bússola pertencia à mãe de Sandoval. Eu precisa me livrar dela, era uma punição para mim, o símbolo de meu pecado. Meu amigo, me perdoe, mais uma vez eu lhe peço.

Sandoval bate com os punhos na mesa, enquanto os demais o observam estarrecidos.

Eu tinha certeza que era a bussola da minha avó. Ela morreu repetindo isso, milhões de vezes, dizendo que minha mãe tinha desaparecido com a joia.

O bispo prossegue, pesaroso:

— Pois é, Sandoval, isso me trouxe muitos problemas. Tanto, que tive a ideia de inventar a história que ela tinha sido doada à igreja no dia do batismo de dona Santa. Reconheço que foi uma canalhice sem perdão, mas eu não peço que me perdoem. Pedirei a Deus, como já tenho feito todos os dias de minha vida.

— E você, Santa, compactuou com esta sujeira. Como foi capaz?

— Eu não sabia de nada, Sandoval. O bispo me confidenciou um pouco antes do aniversário. Você não pode me acusar disso, pelo amor de Deus!

— É verdade, amigo Sandoval, ela não sabia de nada – confirma o bispo, mostrando remorso.

— Ora, vai se fuder! Não me chame de amigo, você transou com a minha mãe,ficou com uma joia de família, inventou que era um presente à igreja e fala isso agora, com essa cara de pau!, um padre, um bispo, você na verdade, é um velho sacana, isso sim! Você é um canalha, eu devia acabar com a sua carcaça podre!

Ricardo não esconde o sorriso e uma certa vingança pela revelação de Santa, ouvindo atento a explicação do bispo Martim.

— Eu segui o que dona Santa me pediu, por favor – o bispo suplica, assustado – Eu me expus na frente de todos, revelei situações e sentimentos que já estavam mortos no passado, os quais eu temia até em pensar. Vivos, apenas na minha lembrança e no meu remorso. Agora, estou livre. Se vocês me perdoam ou não, não posso fazer nada. Mas se pequei, devo a Deus o beneplácito do perdão. Mas, parece que não apenas eu devo à sociedade, Sandoval. Acho que Linda também tem muito a dizer.

— Quer acusar a Linda também? Não quer ficar sozinho na sacanagem? – indaga Sandoval, com exagerado desvelo.

Alfredo encara o pai com desconfiança.

— O que Linda tem a ver com isso, mamãe?

terça-feira, agosto 02, 2016

A CIDADE QUE SABIA DEMAIS - CAPÍTULO 17

No capítulo anterior o detetive Júlio Ramirez encontrou-se com o delegado Borba. A partir dessa conversa, teve novos planos e num encontro com o seu amigo Jairo, um madereiro que estava trocando de negócios, com a intenção de instalar um camping na cidade, decide falar sobre os suspeitos.

Capítulo 17


Júlio encontra o amigo Jairo no bar. Tomam uma cerveja e recordam os velhos tempos. Em seguida porém, o tema passa a ser os crimes não solucionados na cidade. Jairo pergunta a quanto anda a investigação do detetive.

— Bom, meu amigo, a passo de tartaruga, como tudo nessa cidade. Mas acho que estou no caminho certo.

— E o que se passou com o delegado?

— Como sabe que estive lá?

— Marília me contou. Ela viu quando você se dirigiu à delegacia.

— Aquela moça fala demais, não acha?

— Sabe de uma coisa, Júlio? Eu ouço e fico calado. Deixo que as pessoas expressem os seus sentimentos, as suas curiosidades e vou sabendo de tudo. É uma boa tática, acredito eu.

—Tenho certeza de que sim.

— Então esteve na delegacia mesmo?

— Estive sim, e a conversa com o delegado Borba a princípio não foi muito producente, mas com o passar do tempo, sei que incuti umas caraminholas na cabeça dele.

— E o que você queria?

— Ajuda. Queria que fizesse uns interrogatórios. Tenho alguns suspeitos, principalmente pelo crime da moça, mas pode haver alguma relação com os demais.

— Você pode me dizer alguma coisa sobre isso?

— Você é meu amigo e confio em você. Claro que sim, mas precisamos conversar com mais sigilo – e aproximando-se um pouco, no balcão onde estão lado a lado, Júlio prossegue em tom mais baixo – tenho alguns suspeitos sim.

— É gente importante?

—Digamos que é gente importante ou conhecida.

Jairo ri irônico, afirmando que todo mundo é conhecido na cidade. Júlio — Sim, mas veja bem. Há pessoas que são conhecidas pela sua atividade, outras porque tem um parentesco importante. A isso que me refiro.

— Aí a coisa muda de figura. Se falamos no prefeito, por exemplo...

— Você sabe de alguma coisa dele?

— Na verdade não, apenas o que todo mundo sabe, ou seja, que é um prefeito relapso. A cidade vive na penúria, faltando asfalto nas avenidas principais, a ponte está em estado precário, as praças em verdadeiro abandono. É meu amigo, votamos mal, muito mal. O sujeito que está aí não correspondeu às nossas expectativas.

— E quanto ao filho dele?

— Esse aí dizem que está envolvido com drogas. Mas é o que o povo diz. Não se tem certeza de nada.

— Pois eu acho que ele é um dos suspeitos – Júlio volta-se para os lados, para ver se há alguém nas redondezas, mas aliviado, percebe que o bar está praticamente vazio. Apenas um casal de namorados conversa animado numa mesa aos fundos, próxima à janela que dá para a esquina. Então, ele prossegue.

— Este rapaz é protegido pelo pai, como andei averiguando. Ele promove as festinhas à beira do rio, contrata prostitutas para abrilhantar as festas, consegue drogas e segundo me parece, é um cara violento. E além disso, meu caro, numa festa dessas onde acontece de tudo, pode acontecer um crime, porque estão desorientados, completamente.

— Sim, é bem provável.

— Mas há outros suspeitos, eu preciso chegar a um definidor comum.

— Como assim?

— Alguns tinham motivos para matar a moça, outros, como no caso do grupo do lual, provavelmente em virtude de drogas e do tráfico.

— E quais seriam os outros?

— Bem, temos o próprio médico, o doutor Ricardo Silveira. Segundo consta, a moça ficou completamente apaixonada por ele, queria que namorassem a todo custo. E o que ele me contou, é que tiveram alguns encontros casuais, sem qualquer compromisso, embora ela tenha confundido tudo. Para livrar-se do incômodo, ele a matou, afinal tem um nome a zelar, uma namorada com muito prestígio na capital.

— O senhor acha que ele a teria matado por isso?

— Tudo é possível, meu amigo. Nos dias atuais, não se sabe em quem confiar, mas particularmente, eu não acredito não. Vou lhe contar um segredo, pra mim, este médico é um bom sujeito. Ele não mataria ninguém. Para a polícia, entretanto, é o suspeito número um.

— É o que todo mundo fala.

— Aqui impera o senso comum.

—E os outros?

— Veja bem, tem um sujeito muito estranho, inclusive é amigo de Ricardo, o médico, embora eles não sejam muito chegados, na verdade.

Jairo coça o bigode, intrigado. Os olhos pequenos e brilhantes expressam uma curiosidade intensa, como se estivesse assistindo um filme de mistério. Aguarda paciente o resultado da lista de suspeitos. Júlio sorri, satisfeito, observando o interesse do amigo.

— Quem é esse cara?

— Raul Soares. Já ouviu falar? É o filho da mulher que me chamou até aqui, por incrível que pareça, a dona Sara Soares.

— Mas por que você acha que ele tem alguma coisa a ver com o crime?

— Não sei se diretamente, mas ele é um cara complicado. É um homem adulto, que foi deixado pela mulher e não se conforma. Vive fumando maconha como um adolescente em crise e se diz atacado por um pessoal da pet shop, que queria matá-lo.

— É verdade isso?

— É o que diz. E olhe como pretendiam matá-lo, injetando insulina no infeliz. A sorte dele é que é diabético.

— Como assim? Não entendi a conclusão.

— Porque segundo os especialistas, as pessoas saudáveis que forem injetadas com insulina podem morrer e o pior, não se descobre o motivo da morte com facilidade.

— Que coisa incrível!

— Pois é meu caro. E imagine você, que a mãe me contratou por um motivo muito especial que já lhe conto daqui a pouco. Na verdade, ela me falou dos assassinos deste tipo de crime, dos que usavam a insulina e principalmente em turistas. O filho diz que foi uma vítima, mas ela não acredita, considera tudo uma loucura da cabeça dele, porque anda muito depressivo por ter sido abandonado pela mulher. Quanto aos crimes, nada foi provado, inclusive o inquérito arquivado. Mas o mais absurdo de tudo isso é o motivo pelo qual me contratou. ela quer que eu investigue Rosa, a maestrina.

— A mulher que trabalha no hotel?

— Sim, ela atua em várias frentes, inclusive é professora aposentada, se não me engano.

— Acho que sim. Mas por que investigá-la?

— Segundo Sara, o filho, o tal de Raul está há muito tempo no coral e sempre foi humilhado pela maestrina. Ela acha que a mulher tem alguma coisa a ver com os crimes dos turistas e inclusive o assassinato de Taís. Para Sara, Rosa no fundo, tem interesse no seu filho.

— E só por isso, mataria todo mundo? É hilário, não acha?

— Não sei meu amigo, não sei. O que eu posso depreender dessa história é que Rosa é uma mulher carente, que precisa do afeto de alguém para sobreviver. Ela inicialmente teve um afeto muito grande por Raul, mas depois desentendeu-se e passou a humilhá-lo.

— Mas o que isso tem a ver com os crimes?

— O ser humano é muito complexo, meu caro. Rosa transferiu o seu afeto para outra pessoa e passou a odiar Taís, exatamente por esse motivo.

— Agora deu um nó na minha cabeça. Não to entendendo nada.

— Já vou lhe explicar. Taís tinha um namorado, um mecânico chamado Paulo.

— Sim, e daí?

— E daí que o Paulo é protegido de Rosa, inclusive quando ele chegou na cidade, ela o ajudou, concedendo-lhe o direito de morar num apartamento que aluga. Dizem que está perdidamente apaixonada pelo rapaz. Isso pode tê-la levado a cometer o crime, não concorda comigo?

— Pensando por esta lógica, sim, sem dúvida.

— Mas tem outro suspeito.

— Outro? Meu Deus, é um quebra-cabeça!

— Sim, o mecânico. Ele amava Taís e tinha muito ciúmes dela, a ponto de tomar satisfações com o médico. Ele pode ser o suspeito número um. Preciso investigá-lo, logo que volte à cidade.

— É meu amigo, você vai ter muito trabalho para desenredar esta trama.

— Você tem razão, até mesmo porque eu estou pensando noutra pessoa. Você conhece o veterinário da cidade? Ainda não sei o nome dele.

— Pois por incrível que pareça, este eu não conheço.

— Pois segundo minhas investigações, ele é um sujeito muito reservado e reacionário. Parece que é engajado num grupo de ultra-conservadores que pretende acabar com os avanços sociais e entre eles, o que ele considera ultrajante na sociedade.

— E que relação pode ter com os crimes?

— Se o cara é reacionário desta forma, um Bolsanaro da vida, quem pode afirmar que ele não lutou para acabar com o que considera imoral, como a própria Taís, que procurava drogas nas festinhas do rio, ou nos turistas que trazem novos costumes à cidade?

— Então, meu caro detetive, temos uma lista enorme de suspeitos.

— É que não lhe falei no seu Domingues.

— Seu Domingues? O velhinho que era dono do posto? Está brincando!

— Ele acusa o médico de negligência com a sua esposa, quando ainda era residente, aqui na cidade. Segundo ele, ela morreu numa crise diabética por erro médico. Será que ele não quer vingar a morte da esposa, provocando outras mortes? Temos que considerar todas as hipóteses, meu amigo. Todas.

— É uma loucura tudo isso. Jamais poderia imaginar que isso acontecesse em nossa cidade tão pacata.

— Mas falando em pacata, me diga como está o seu empreendimento do camping, que você quer construir poróximo ao rio, naquela região da ponte?

Jairo emudece. De repente, uma sombra passa por seus olhos e expressa uma preocupação latente.

— A coisa tá difícil. Não consegui levar adiante. Tem o problema do Ibama que não está liberando, além disso, essa série de acontecimentos está prejudicando o meu negócio. Não to conseguindo fazer uma boa publicidade para uma futura instalação do camping.

— Por causa dos crimes?

— Principalmente destas malditas festas que os jovens promovem. O povo quer um lugar tranquilo, não posso oferecer isso por enquanto.

— Quem sabe as coisas se acomodem, não?

— É o que eu espero. Mas tenho certeza de que de uma maneira ou outra, vou conseguir fazer o meu investimento na cidade. Você vai ver.

Os dois encerram a cerveja e Júlio convida o amigo para uma outra rodada. Este no entanto, parece subitamente apressado em retirar-se. Afasta-se em seguida e Júlio fica observando-o pela vidraça do bar, intrigado.

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