Se a noite despertasse um só suspiro que não fosse o meu, se a noite me levasse a sonhos que não despertassem, se a noite dispusesse apenas o silêncio e escamoteasse o medo. Não. Ela se apodera aos poucos de meus pensamentos e sublima as dores esparsas, mas constantes, transforma as linhas da tela, os ecos das músicas, os ruídos da rua. Talvez latidos distantes, resmungos de alguém que surrupia como um mágico também as suas dores. Ali passa, ali funga, ali fuma, ali fica. Depois, quando o mundo já se estabeleceu em sua mente, afasta-se devagar, vivendo outra história. Quem sabe a realidade também mude aqui dentro, as memórias se restabeleçam, a realidade se instaure de vez. Aos poucos, os sons desapareçam e os lamentos fiquem mais lentos e escassos e a noite se reintegre em sua natureza explícita de ceder ao dia que vai nascer.
Este blog pretende expressar a literatura em suas distintas modalidades, de modo a representar a liberdade na arte de criar, aliada à criatividade muitas vezes absurda da sociedade em que vivemos. Por outro lado, pretende mostrar o cotidiano, a política, a discussão sobre cinema e filmes favoritos, bem como qualquer assunto referente à cultura.
quinta-feira, agosto 24, 2023
Um só suspiro
sábado, julho 16, 2022
Traço caminhos
Quando vires minha mão estremecer, não faças diagnóstico sobre meu estado físico ou emocional. Quando perceberes meu olhar flutuar, não penses que meus sonhos já se foram. Quando ouvires meus argumentos, não te surpreendas com meu desabafo dilacerado. Quando notares que mal me movimento nas noites, não julgues a falta de jeito. Não conheces minhas dores, nem meus pensamentos. Não sabes de onde venho e de meu desamparo. Não peço teu acolhimento, talvez apenas teu olhar. Pode ser assim, oblíquo e disfarçado, pode ser apenas a visão de um segundo. Pode ser um gesto perturbado de um espaço invasivo, mas que não seja hostil. Não precisas falar, nem sorrir. Talvez, apenas que reconheças a minha humanidade, como a tua.
Quando estiver em frente a tua casa, na soleira de tua porta, no toque da campainha, apenas pergunta o que quero. Saberás da minha fome como necessidade básica e também emocional. Saberás que vou além do ser, quase objeto, que perpassa a tua fronteira, sou também alma escondida em vestes precárias, mas que se assemelha a tua. Não quero a tua culpa, nem o teu medo, nem as dores que transfiguram tuas emoções. Sei que somos iguais, as dores não escolhem o sujeito, porque nossa vida é assim, mediana, só isso. A diferença entre nós, é que podes agir, de algum modo. Eu, apenas traço caminhos em círculos e às vezes, num deles, também te encontro. Vivo passivamente, esperando não sei o quê, pois se já tive passado, não tenho futuro.
Que teu ódio não faça de mim, o alvo, mas aos que controlam as armas que nos ajudam a matar.
Iustração: https://pixabay.com/pt/photos/crianças-favelas-pobreza-pobre-2876359/
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