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sábado, julho 16, 2022

Traço caminhos

Quando vires minha mão estremecer, não faças diagnóstico sobre meu estado físico ou emocional. Quando perceberes meu olhar flutuar, não penses que meus sonhos já se foram. Quando ouvires meus argumentos, não te surpreendas com meu desabafo dilacerado. Quando notares que mal me movimento nas noites, não julgues a falta de jeito. Não conheces minhas dores, nem meus pensamentos. Não sabes de onde venho e de meu desamparo. Não peço teu acolhimento, talvez apenas teu olhar. Pode ser assim, oblíquo e disfarçado, pode ser apenas a visão de um segundo. Pode ser um gesto perturbado de um espaço invasivo, mas que não seja hostil. Não precisas falar, nem sorrir. Talvez, apenas que reconheças a minha humanidade, como a tua.

Quando estiver em frente a tua casa, na soleira de tua porta, no toque da campainha, apenas pergunta o que quero. Saberás da minha fome como necessidade básica e também emocional. Saberás que vou além do ser, quase objeto, que perpassa a tua fronteira, sou também alma escondida em vestes precárias, mas que se assemelha a tua. Não quero a tua culpa, nem o teu medo, nem as dores que transfiguram tuas emoções. Sei que somos iguais, as dores não escolhem o sujeito, porque nossa vida é assim, mediana, só isso. A diferença entre nós, é que podes agir, de algum modo. Eu, apenas traço caminhos em círculos e às vezes, num deles, também te encontro. Vivo passivamente, esperando não sei o quê, pois se já tive passado, não tenho futuro.

Que teu ódio não faça de mim, o alvo, mas aos que controlam as armas que nos ajudam a matar.


Iustração: https://pixabay.com/pt/photos/crianças-favelas-pobreza-pobre-2876359/

sexta-feira, novembro 03, 2017

Os dez textos mais acessados em outubro de 2017

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2. SOU DO CONTRA!

3. PIOLHOS DE RICO

4. TRABALHO VOLUNTÁRIO NO HOSPITAL PSIQUIÁTRICO : UMA PROVOCAÇÃO PARA A VIDA

5. A catarse do escritor

6. O bibliotecário e o escritor

7. Um olhar instigador

8. Sonhos na lagoa

9. Onde chegará o homem?

10. Triste Brasil


quinta-feira, novembro 05, 2015

A velhinha do riacho

Era assim, baixa, cabelo espichado num coque sugado no topo da cabeça. Tinha aquele jeito amável de ser, mas se a examinássemos com cuidado, veríamos uma sagacidade no olhar, um meio sorriso nos lábios e uma artimanha escondida nas mãos que jamais imaginaríamos.

Mas ela era assim, tranquila, doce, solícita e focada nos seus objetivos. Nada a despertava de seus cuidados constantes com o croché, com a linha desobediente arriscando-se entre seus dedos a se tornar mais uma fiel: corregionária da fé. Por certo obedeceria seus gestos ágeis, embora, inseguros e faria os contornos necessários para o desenho.

Ela tinha seus caprichos. Tinha consigo que deveria fazer as coisas da melhor maneira possível e se asssim aprendera de geração em geração, era seu dever fazê-lo.

Era conservadora nos seus segredos e via de regra, mantinha a tradição.

Outra coisa que gostava, era de prosear. E até fumava, meio às escondidas, um cigarro de palha. Tinha uma tosse danada, daquelas que nem alecrim cheiroso cura, mas persistia no vício.

Sentava à beira do avarandado e puxava conversa. Seus olhinhos miúdos, quase escondidos, entre pesados sulcos, brilhavam. Sua boca de poucos dentes desafiava a memória de qualquer um. E lembrava, e contava e argumentava sobre as histórias mais cabulosas. Sabia de tudo. Nada lhe passava, que ficasse no esquecimento. Ao contrário, tinha uma memória prodigiosa, principalmente quando algum fato escabroso assombrava a pequena povoação. Mas esse assombramento, esse destempero, nada tinha a ver com alma penada ou assombração. Tinha a ver com gente da cidade, políticos, militares, advogados, donas de casa, sacerdotes, gente de qualquer profissão ou vocacão. Até os vagabundos tinham a sua história. E como tinham. Aí, brilhava o seu lado progressista.

A tradição passada de geração a geração era esquecida. Ou compartilhada. Ela ficava bambaleando entre a tradição, a posição conservadora e a progressista, que desafiava o caráter de qualquer um. Tinha este carisma, este dom, de ultrapassar barreiras ou ficar me cima do muro. O único problema, e ela não sabia disso, é que poucos confiavam nela. Quem poderia confiar numa pessoa que passava de uma margem a outra, sem pestanejar, sem molhar os pés, sem se preocupar.

É, ela era assim. E há políticos, que são bem parecidos, saltam de partido em partido e lutam para criar outros. Tal como a velhinha do riacho.

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