Quando passava pela rua, me dei conta que terminava num beco escuro. A escuridão se afunilava no medo, na falta de perícia em enfrentar o desconhecido, na exigência de encontrar uma saída. Mas qual! Cada vez, o perigo absurdo e sinistro avançava, como numa névoa de filme de terror. Um uivo aqui, um ecoado lá. A impressão que tinha é que uma coruja cantava ao longe. Não que sugerisse mau agouro, o agouro já era tão presente, que nem valia à pena exortar estes medos menores.
Mas precisava seguir o caminho e este parecia mais longo, embora a bifurcação na esquina se escondesse sob uma árvore, ou o que parecia ser árvore naquela escuridão de sombras e pequenos flashes nas calçadas. Na verdade, as calçadas se diluíam em uma terra lamacenta que se insurgia sob meus pés afundados numa passagem visguenta, como se um verme se apoderasse deles e os corroesse aos poucos, devagar, para sentir o gozo da tortura. Mesmo assim, afundando um pé e retirando o outro, afastei-me aos poucos, do que me parecia uma armadilha.
Ao longe, uma luz de farol na neblina que se insinuava. Por certo, o beco se transformaria num lugar conhecido e aberto e as pessoas passeassem, músicas e danças fruíssem e o mundo seria o mesmo de antes. Por certo, aquela luz influenciaria todo o aspecto soturno e as dores seriam apenas as do coração.
Parei então, fumei um cigarro, uma bagana qualquer, senti aquele ressecado no nariz e na garganta e uma certa esperança.
Entretanto, a luz forte que se aproximava de repente, assim, como do nada, me cegou completamente e pude perceber que aquela luz nada mais era do que um dos últimos suspiros de uma claridade antiga, de uma felicidade morna que como num déjà vu mostrou o passado. O presente? Este era mais escuro, sombrio e assustador do que aquele beco, no qual nunca pisei.
Fonte da ilustração: https://pixabay.com/pt/users/geralt-9301/
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