
Hoje, acordei, nem sei porquê, tendo como imagem a presença de um buraco ou talvez, a ausência da areia, que ao ser retirada, para constituir a cavidade, aumente cada vez mais a lacuna.
E me veio à mente, o que é natural, que cada vez que se retira a areia, ou a terra, ou a lama, ou o entulho, o buraco fica maior, vira cratera e parece invencível, com sua boca enorme, pedindo mais.
Na verdade, quanto mais se tira, mais se precisa e nos parece que a cavidade que estamos produzindo, nunca chega ao seu termo.
Então, relacionei a areia retirada com os prazeres, que ao serem desfrutados, cada vez mais se precisa de outros maiores, mais intensos e complexos para satisfazer o vazio que se forma.
Os prazeres precisam alimentar a fome que se tem da vida, esse enorme buraco que se forma, pedindo mais, tornando-se o vácuo maior, como uma grande boca sedenta ou faminta.
É o que frequentemente se faz no Natal, queremos tapar esta boca imensa, essa cratera que temos através de presentes, compras de todos os tipos, tamanhos e matizes, para fomentar o imenso monstro que se apega a nossos pés, a nossos corpos, puxando-nos para suas entranhas, sugando o que talvez nem tenhamos para oferecer.
Os pequenos prazeres, no entanto, aqueles que cumprimos à mesa com os nossos, o viver o Natal no dia a dia, enfeitando nossas árvores, puxando um galho daqui, enlaçando o outro ali, cercando-nos de carinho e afeição, um sorriso afetuoso, um olhar denso, terno e sincero, uma oração tranquila, um aperto de mão: estes acalmam a alma. Destronam o monstro que nos cerca, engole o vazio.
Somos assim, plenos, verdadeiros e fortes.
Os menores prazeres ou os mais simples, os que vivemos nos trezentos e tantos dias do ano, estes rotineiros e esquecidos, esses sim, preenchem nossos momentos, afagam o coração, aquecem o espírito.
Basta pouco, basta que vivamos o Natal durante todo o tempo, se possível, lembrando que o Aniversariante busca em nossas almas o melhor de nós mesmos: esta simplicidade que acomoda e aquieta. Esta vida que corre límpida, ordeira e franca. Esta vontade de ser assim, um pouco melhor, cada dia.
Isso basta. Isto acolhe. Isto é Natal.
Fonte da ilustração: https://pixabay.com/pt/natal-sonho-santa-felicidade-1881708/PeteLinforth
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