Precisava sair e ver de perto aquelas crianças que sorriam, corriam por terrenos baldios, fingindo que eram campos de futebol e se perdiam alegres na experiência do sol. Então, me perguntei angustiado, onde ficava a dor? A dor dos que se consumiam em contas, em brigas rebuscadas, em tons alternativos de valentia e medo.
Onde ficava a morte rasteira que rondava os condomínios abarrotados de perfis estranhos e desconfiados. Por que não se sabia seus nomes? Por que as crianças brincavam felizes? A felicidade não tinha ambiente naquele meio.
Ela até vinha devagarinho, teimosa e se alojava naqueles olhos febris, nos corações vigorosos de quem corre e pula e brinca e se esfarela em sonho e esperança. Que queriam as crianças da favela? Por que se alienavam da fuligem dos fogos em fundos de quintais, de calçadas quebradas e veias dispersas de águas turvas e nojentas. Por que ultrapassavam a borra das valetas imundas, enlameadas de dejetos e o que mais entulhava as valas dos porcos?
Do que se alimentavam as crianças que sorriam felizes e rápidas, do pouco de luz que brilhava em suas testas reluzentes de suor? Por que se confundiam com os esgotos e os zumbis que cercavam as vielas sem arame? Por que não eram observadas? Faltava pouco para os holofotes brilharem em seus rostos, mais do que o sol, a risada fora de hora, o brilho da felicidade intrínseca.
Eles estavam chegando e mais cedo ou mais tarde acariciariam seus cabelos revoltos, sorririam com seus dentes de porcelana e os abraçariam, sentindo seus suores, ranhos e lágrimas. Ouviriam seus gritos, sem lamúria, sem dor, só sorrisos e esperanças. Depois se afastariam, como homens de preto para voltarem só daqui a quatro anos.
Fonte da ilustração: https://pixabay.com/pt/photos/menina-menino-irmão-pobre-favelas-2754233/Billy Cedeno
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