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Lendo os artigos dos alunos e participantes da LES, ficou-me a impressão de que as pessoas aos poucos se acomodam ou se adaptam de acordo com as circunstâncias em que estão envolvidas. Tenho comigo, que os guris e gurias não se dão conta da extrema relevância de suas atuações, produzidas através de atitudes, procedimentos e interesses pessoais e coletivos. Já explico. Seus interesses podem ser até inconscientes. Querem, precisam como todo ser humano estar junto, participar, partilhar dos acontecimentos, de tal forma que suas ações sejam reconhecidas pelo grupo e muito mais do que isso, que eles próprios interiorizem em suas mentes a capacidade humanitária de doação, mesmo que os sentimentos sejam confusos, conturbados e toda a correnteza não surja com clareza. Mas as águas descem rápidas pela cachoeira, formam veios nas rochas que jamais são apagados pela natureza, ao contrário, eles crescem, se aprofundam e tornam-se verdadeiros cortes. Da mesma forma, elas produzem energia e explodem em beleza inqualificável. Assim é a mente do jovem, quando desperta para a troca de experiências, e, embora utilizando plataformas científicas e filosofias educacionais, como as atribuídas a Paulo Freire e outros mestres, elas transbordam no amor. O amor pelo próximo, o amor pelo conhecimento implícito dos que pouco sabem da academia, mas muito conhecem da vida, o amor pela história, pelas peculiaridades da vida em comunidade, pela igualdade de condições, embora em patamares diversos. O amor do jovem abre caminhos para o conhecimento muito maior do que o encontrado nos compêndios científicos, pois permite que caminhem em vaivém, cruzando expectativas e experiências, nunca em paralelo, como linhas que jamais se encontram. O jovem se encontra e quer cultivar este encontro. Quer emancipar suas descobertas. Quer prevalecer a raiz da informação mais tenra, dando lugar à palavra do artesão, da dona de casa, do menino pescador, do trabalhador dos mares, do idoso solitário, do gritar mais alto da garganta oculta, onde as vozes quase nunca são ouvidas, onde os homens são invisíveis, esquecidos de uma sociedade baseada no senso comum, onde pobre, negro ou gay é marginal. Uma sociedade que grita por socorro, que almeja saídas, onde o humilde não tem voz.
Ficou-me, acima de tudo, a reflexão de que a necessidade do ser humano interagir com seus pares é quase uma emergência. (Falo “seus pares” aqui, pela faculdade de seres da mesma condição humana, moradores deste planeta, não me referindo à posição social ou intelectual). Percebe-se, portanto, que este projeto chamado Liga de Educação e Saúde (LES), possui uma estrutura elaborada a partir de teorias de educação perpetradas por grandes educadores e filósofos da educação, como citados, mas que acima de tudo, somente se desenvolve a partir do querer inovador e de seus participantes, da ânsia devoradora que somente consome os que sonham, da disputa interna em decidir o caminho mais adequado, mesmo quando existem centenas de outros, muito mais prazerosos ou melhor aceitos pela sociedade e pela academia, que pretende manter o status quo, sem quaisquer mudanças em seus critérios. Sabemos que mudanças produzem o medo e este paralisa os reacionários, cujas máscaras incólumes não devem ser analisadas para que a discussão não sobreviva. E é o que esta juventude sabe fazer melhor. E com frescor. Discutir. Discutir sobre tudo, inclusive sobre suas procuras, sobre suas dúvidas, e sobre os caminhos que trilham. Isso é o que lhes leva ao conhecimento, à troca de experiências, à aprendizagem, à “ensinagem", como apregoam. Eles têm um olhar peculiar, atento e alerta na sua realidade interior e na dos que compartilham seu conhecimento. Um sentimento que aflora, que alcança voos elevados, a ponto de se identificarem com a verdade do outro. Eles vão além das trocas de experiências, do encontro, da interação com os diversos tipos de pessoas com as quais mantém convivência. Pessoas estas que vão ao encontro de seus sonhos recônditos, de suas vontades adormecidas, de suas declarações internas de amor ao próximo, de seus sentimentos transbordantes em ações e que ficam guardados e esquecidos, em virtude da diáspora criada na sociedade em que vivemos. Como antídoto a esta carência, os guris e gurias possuem as ferramentas da solidariedade, paixão e alegria. Uma alegria genuína de quem não se preocupa em agradar, em competir ou mostrar conhecimento. Uma alegria genuína que só a juventude tem.
Nem preciso reiterar sobre o tema, porque foi trabalhado com brilhantismo nos diversos relatos. Mas só queria dar este registro e retomar uma ideia que parecia extinta dos meios acadêmicos: a rebeldia. Não a rebeldia falsa e falida dos black blocks, mas a rebeldia de não aceitar o pré estabelecido, tal como ocorria na época da ditadura. A rebeldia em refutar as coisas prontas, consumadas, sem a hipótese de mudança. A rebeldia em contestar o senso comum, o que é correto para uma determinada classe elitista e conveniente com seus valores conservadores, na qual nada mais importa do que manter o establishment. O pobre deve estar onde sempre esteve, bem longe dos meios esclarecidos, intelectuais, da gente que pensa, que manda. Para eles, o trabalho braçal, apenas. Ou a fome, a miséria, a marginalidade. Tal como é apregoado por um personagem humorístico e que infelizmente, até mesmo pessoas humildes acham graça, reiterando a posição medíocre onde o pobre deve ficar, na esquina mais longe de nossas fronteiras. Eu, que continuo um rebelde, lutando por causas que percebo que até meus próprios pares se surpreendem, fico feliz com esta liberdade alicerçada em valores tão puros e tão vigorosos que permeiam as mentes avançadas de nossos jovens. Fico feliz, por existirem grupos que não se deterioram com a alienação do consumismo, dos prazeres transitórios, das facilidades burguesas. Não mais, a flagelação dos sentimentos em função do poder, do dinheiro, da ostentação de ser mais ou melhor (ou ter), da competitividade desenfreada, da exacerbação do corpo, da caricaturização da alma. Há jovens que pensam sim. Há jovens que sentem, que se emocionam, que lutam por transformações, que trocam experiências, que apreendem com os outros, que cultivam valores sociais, humanistas, que vivem. Este jovens estão tão próximos de nós e nem nos damos conta, mergulhados que estamos na invocação aparente da juventude que surge todos os dias na mídia. Há jovem evoluídos, entretanto, que sabem e somente eles, que a vida é muito mais que uma passagem monótona e cerceada por muros contendores das normas conservadoras. Sabem que podem abrir brechas, que desembocam em grandes oceanos, para formar, a partir daí, as vertentes que desaguam em outras terras, terras antes inférteis pelos descuidados humanos. Há o que cuidar, o que plantar. Elas, por certo, darão muitos e bons frutos. E eles… bem, eles continuarão rebeldes, porque a rebeldia é um ato de liberdade.
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