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A bruma que apascenta

Que quisera eu agora? Que quisera saber do mar, das ondas que rebuliçam no cais, nos degraus que servem de apoio aos homens que chegam com mais facilidade em suas embarcações? Que me importam as oferendas com quindins, algumas velas e garrafas de aguardente? Talvez elas digam alguma coisa a quem procura afeto e fé. Não sei. Mas, e as vísceras de peixe atiradas nas águas, como se fosse a regra, livrar-se do entulho que deveria ir para o lixo orgânico? Que quisera saber dos pensamentos, dos desejos, das buscas e sonhos dos que jazem por ali, sentados atrás de colunas ou postes fumando um baseado e olhando perdidos para a lagoa. O que buscam em seus sonhos se é que os tem? O que importam os gritos da mulher que vende balas ou doces ou pastéis, ou quaisquer outros alimentos, enquanto se sente de algum modo ultrajada pelas cobranças dos vendedores estabelecidos, bem a sua frente? Que importa a maré de pessoas que descem da lancha e se dispersam rumo às casas, lojas, talvez banco

A hóstia na boca e a arma na mão

Hoje, vinha pela ladeira e sentia que meus pés afundavam nas estruturas tortas de paralelepípedos da Riachuelo, a rua protegida pelo rei. Na verdade, a ladeira se produzia em meus pensamentos que sucumbiam em tortuosas reflexões. Numa esquina, entre a conversa de um amigo, observei a cena de um grupo de homens que apontavam para dois rapazes que atravessavam a Benjamim, provavelmente em direção ao calçadão. Com olhares furiosos, exclamavam que vivíamos um novo tempo, em que todos os gays que se mostrassem afeminados, como aqueles, seriam gravados tendo o vídeo divulgado nas redes sociais, após levarem uma boa surra (usaram um termo pior). Afinal, tinham a permissão de um líder que os afiançava. Quando voltei a andar, de pernas quase trôpegas, voltei-me para o acinzentado da laguna. Nem sei se o céu estava azul, mas as águas pairavam revoltas no cais. Olhei-as, ensimesmado e lembrei das últimas palavras de um moreno barbudo, que parecia realçar a sua “descendência ariana”, af

Eu e os carros antigos

Tenho esta mania de fotografar carros antigos. Nem é interesse por determinados modelos ou por conhecimento de motores ou marcas importantes. Nem tenho qualquer coleção, mesmo porque é preciso demandar um bom dinheiro para este tipo de hobby. Entretanto, sempre que vou a Montevidéu e noutras cidades do interior do Uruguai, tento fotografar aqueles automóveis datados de épocas tão antigas e que parecem contar muito de seu passado. Fico talvez, na minha posição de escritor, inventando histórias. Mas histórias plausíveis, que talvez fossem tão verdadeiras como se as vivêssemos. Uma lembrança que me vem em momentos, como num déjà vu de algo que nao vivi. Há os que falam em universo paralelo para este tipo de evento, mas evitarei este tema, até por não ter certezas absolutas. Deixo para os pesquisadores e os escritores de ficção científica. Penso, porém naquele carro verde e pequeno da década de 50, que deve ter servido por muitos anos a uma família de imigrantes italianos, que veio se i