Estava na sala de aula, observando um pássaro que insistia em pousar no muro, próximo à janela. O professor de português, um homem baixinho, de cabelos brancos e barba rala aproximou-se e perguntou, se não estava ouvindo o que ele dissera.
Na verdade, eu nem ouvira o que ele me perguntara, mas fiz uma observação sobre o pássaro, como se fosse a coisa mais importante a ser dita. Ele balançou a cabeça e balbuciou entre lábios, indicando-me um livro que abria com energia sobre a classe.
Olhei-o quieto e passei a ler o livro e esperar que se afastasse na direção de sua mesa ou do quadro. De lá, ele perguntou se eu sabia que naquele 1º de setembro, seria o primeiro dia do hasteamento da bandeira, atividade que se faria até o dia anterior ao desfile, no 7 de setembro. Afirmei rapidamente, junto com outras vozes dos colegas que confirmavam a atividade. O professor mais uma vez insistiu, se eu não lembrava que neste primeiro dia, eu havia sido sorteado. Eu sabia disso e como lhe afirmar mais uma vez, se todas aquelas vozes falavam juntas e ele parecia tão zangado.
Quando tentei justificar-me, ele me interrompeu, dizendo que eu ficasse olhando para o pássaro, pois seria trocado por outro aluno mais atento. Fiquei muito frustrado, afinal, havia sonhado com aquele momento. Era uma sorte, eu ter sido escolhido e ainda perdia a oportunidade por estar olhando para um pássaro na janela.
O professor prosseguiu a aula e na hora indicada, levou a turma, juntando-se às demais no pátio da escola. Olhei para a janela novamente, mas o pássaro havia sumido.
Então, resignado, fui até o cenário indicado e assisti um colega exercendo a função que seria minha. Um dos auxiliares colocou o disco e acompanhamos o hino nacional.
Voltando para a aula, o professor, como era de hábito, exigiu que fizéssemos uma redação. Todo o dia, precisávamos entregar uma pequena redação, para que ele avaliasse e comentasse no dia seguinte.
Então, lembrei do pássaro na janela e decidi descrevê-lo. Falei da beleza da plumagem e me detive nas cores das plumas de sua cabeça, de um azul luminoso e forte, o que me fez lembrar da bandeira do Brasil. Afinal, uma das cores estava ali tão bem representada naquele fragmento da natureza. Imaginei o pássaro dando alguns voos em busca de alimento e mais longe, quiçá, ensaiando pequenos passos sobre a grama verde, sendo acariciado pelo sol primaveril, retocando as cores e a vida.
Talvez, tudo expressasse aquele momento, no qual, nós como os pássaros, nos conectávamos com as cores, assim como a bandeira hasteada, presente em todos os seus matizes e símbolos. Sabíamos que seu dia era o de 19 de novembro e talvez, eu, tal como o pássaro que talvez voltasse ao muro, pudesse partilhar daquele momento futuro e hastear a bandeira, sentindo-me feliz e honrado.
O professor Martinez leu a redação, sorriu e fez a sua avaliação. Disse-me mais tarde, que não precisaria esperar até novembro e que participaria junto com outros colegas do hasteamento, já que havia decidido hastear a bandeira no próprio dia 7 de setembro, antes de sairmos da escola, embora houvesse o desfile.
Não sei se ele fez esta mudança por mim, pela redação ou por perceber que estava muito envolvido no evento. O que sei é que o pássaro de cabeça azul, pousado próximo à janela, tivera uma participação especial em minha imaginação.
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